Boa tarde amigos,
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Um Café Com Sêneca (capa). |
O mundo, diria minha avó sobre a geração subsequente à sua, anda de “pernas para o ar”, bordão antigo que ilustrava a concepção de que tudo estaria mudando, revirado, ao avesso, incluindo os costumes e valores. A verdade, porém, é que a história se repete e em ciclos. Fato é que o planeta Terra, com seus habitantes naturais, continuam com os mesmos problemas e questionamentos das épocas mais remotas, o que segundo a observação de David Fideler[1] “No fim das contas, a época de Sêneca é a nossa época. Ele é nosso contemporâneo e compartilhamos profundamente das mesmas preocupações.” Tenho notado, nas minhas andanças pelas livrarias da vida, ter crescido significativamente a publicação e o consumo de obras sobre o estoicismo, movimento filosófico que teve em Sêneca (4.a.c.-65 d.C.), um de seus precursores. Esse fascínio por essa corrente filosófica muito se explica, no nosso modo de ver, pela necessidade das novas gerações de pressa, não só para discutir os mistérios da vida, num mero exercício de contemplação, como a de experimentar, na prática, a vivência da chamada “vida que vale a pena ser vivida”, tal como apregoada pelo estoicismo. Envolvendo essencialmente treino, o estoico defende uma filosofia prática como o budismo, o que implica em “colocar as soluções em uso para que funcionem”. O estoicismo nos convida a viver uma vida honesta, ética, com respeito à natureza, sem sofrimento, baseada no fato de que as coisas não são boas, nem ruins, são como são e que o problema são as crenças e os sentimentos que nutrimos em relação a elas. A preocupação (pré-ocupação) é um grande desafio do homem moderno, o que justifica a epidemia mundial da ansiedade, que parece ser o grande mal do século. Mark Twain, ironizando acerca da problematização mental sobre o futuro, afirma “Sou um homem velho e passei por muitos problemas, mas a maioria deles nunca aconteceu.”
Atribui-se à Sêneca, ensinamentos sobre
o autocontrole e a necessidade de abandono dos fenômenos puramente psicológicos
ou imaginários, assim consideradas as preocupações com o futuro ou qualquer
espécie de arrependimento sobre o passado, que apenas se prestam às emoções
negativas, porquanto nenhum deles existe mais no mundo real (passado), nem se sabe se existirão (projeção sob re o
futuro). Essa maneira de vida negativa cria o medo, um medo inexplicável, que
nos paralisa e nos abala profundamente. [2]
Não ignorando, nem desprezando as
emoções, admitindo existirem, ao lado das doenças do corpo, as doenças da alma,
que devem ser tratadas, o estoicismo é muito próximo da terapia denominada hoje
como cognitivo-comportamental, fundada pelo psicoterapeuta, Alberto
Ellis que, quando começava a trabalhar com novos clientes dava a eles, uma
cópia da máxima estoica “Não são as
coisas que nos perturbam e sim as crenças em relação a elas.”. E Laurence Becker, ainda a respeito da
mesma terapia, afirma peremptoriamente que “as
origens filosóficas da teoria cognitiva
podem ser rastreadas até os filósofos estoicos”. Com forte respaldo
científico, esse tipo de terapia, comum nos dias que correm, tem se revelado
eficaz no tratamento de diversos transtornos, como a depressão, a ansiedade
generalizada, a insônia e as fobias em geral. Vale a pena se instruir um pouco
tanto sobre a filosofia milenar dos estoicos, como sobre a terapia
cognitivo-comportamental, a qual tem no estoicismo e seus conceitos, o seu embrião e embasamento. O livro de David Fideler (Um Café com Sêneca – um guia estoico para a arte de viver), com tradução de Robin Waterfield, da editora sextante, é uma ótima oportunidade de
conhecer tanto essa linha da filosofia voltada para a busca da solução
pragmática dos pensamentos negativos, tidos como “males da alma”, como em
relação à terapia cognitivo-comportamental, estruturada para obter a mudança do
paciente, necessária à modificação de seus sentimentos e forma de encarar as
dificuldades próprias da vida de todos nós.
Boa noite amigos.
[1] Um Café Com Sêneca – Um guia Estoico para
a arte de Viver – tradução Heci Regina Candiani, 1ª. edição, Rio de Janeiro,
Sextante Editóra, 2.022, p. 24.
[2] “Como o passado e o futuro estão ausentes
e não podemos sentir nenhum deles só as emoções, as oponiões ou a imaginação
podem ser fonte de dor.”