terça-feira, 29 de abril de 2014

BLUE JASMINE DE WOOD ALLEN

Boa noite amigos,


Depois das homenagens prestadas a Paris (Meia-Noite em Paris- 2.011) e Roma (À Roma com Amor – 2.012), o que foi considerada a  fase européia de sua carreira, o ator, diretor, músico e roteirista Wood Allen volta às origens, desta vez escrevendo e dirigindo a comédia dramática americana Blue Jasmine (2.013), que tem como palcos as cidades de Nova York e São Francisco.  Com orçamento de 18 milhões de dólares e uma arrecadação que já supera a casa dos 80 milhões de dólares, o longa de 98 minutos, tem de mais significativa a interpretação exuberante da protagonista, a australiana,  Cate Blanchett, no papel de Jeanette (Jasmine) Francis (imagem da coluna emprestada de dialpforpopcom.blogspot.com),  com o qual bateu concorrentes de peso  ao levar o Oscar de Melhor Atriz, circunstância que, ao lado da fama do diretor, foram os indicativos mais precisos para a curiosidade dos espectadores e o sucesso de bilheteria. A crítica também foi bastante favorável (5 estrelas do New York Times e The Guardian, 4 do O Globo e do crítico Rubens Ewald, 3 da Folha de São Paulo, ficou com uma bela média de 3,8 entre 23 especialistas de imprensa). No Brasil o longa não está em muitas salas atualmente, foi visto no cinema por menos de 500.000 espectadores (um número expressivo por não ser  Wood Allen considerado popular por aqui),   e já pode ser visto em vídeo ou mediante aquisição ao canal Now, que foi a minha opção de fim de semana. No roteiro,  a história de duas irmãs adotadas, que seguem caminhos diferentes. Jeanette (Jasmine) vive em Nova York, onde se casa com o empresário milionário Harold Francis (Alec Baldwin) e passa a ter uma vida de socialite, com muitos recursos, badalações e requinte, enquanto a irmã Ginger (Sally Haw Kiss), separada do marido, leva uma vida simples e apertada em São Francisco. Jasmine contudo vê seu casamento ruir, o marido ser preso e ela, agora pobre,  tem que recomeçar a vida, pedindo o auxílio da irmã que tanto renegou, o que lhe causa profundo desconforto. O recurso muito utilizado por Allen de alternar o presente com flashes do passado (flash back) também está presente no longa e garante uma boa dinâmica de alternância. Experimente! Um drama com um roteiro simples, mas muito longe de ser superficial, na medida em que mergulha com realismo na profundeza dos sentimentos humanos e é valorizado, como se disse, pela ótima interpretação dos atores.


Até amanhã amigos. 

P.S. (1) Cate Blanchett, de 44 anos,  é atriz e diretora teatral. Na sua filmografia destacam-se os papéis da Rainha Elizabeth em Elizabeth A Era de Ouro (2006) e da atriz Katherine Hepburn em  O Aviador (2004),  de Martin Scorcese,  pelo qual ganhou o Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante.  Esteve também presente na trilogia O Senhor dos Anéis (A Sociedade do Anel, As Duas Torres  o Retrato do Rei).



MEMÓRIAS DA INFÂNCIA - A CARTILHA "CAMINHO SUAVE

Boa noite amigos,

Há alguns meses, visitando um dos sebos do centro da cidade, me deparei com uma cartilha: Caminho Suave. Ao contrário das obras de segunda mão, a tal cartilha estava ali sendo oferecida à venda, em primeira mão. Havia muitos exemplares e a edição era de 2.011, com a observação de que era renovada, ampliada e atualizada com o Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.  Indaguei do atendente a respeito de se tratar eventualmente  da consagrada cartilha adotada  para alfabetização durante mais de 50 anos, mas já proscrita do ensino público,  pelo MEC, em razão de  suposta superação do método adotado por sua autora, a professora primária Branca Alves de Lima (1911-2001). A resposta positiva me encheu de emoção. Transportei-me para o ano de 1.958, quando eu, aos 6 anos de idade, fui admitido no 1º ano do chamado “grupo escolar”, hoje correspondente à 1ª. série do ensino fundamental. Morava em Pirambóia, minha pequenina terra natal situada ao pé da serra de Botucatu. A única escola existente era pública e de características rurais, ou seja, havia apenas uma sala com três fileiras de carteiras acomodando os poucos alunos. Cada uma das fileiras correspondia a uma série (eram apenas os três primeiros anos do grupo escolar que eram oferecidos e depois disso só saindo da cidade acaso se pretendesse continuar os estudos) e a dedicada professora tinha que dar conta do recado, ou seja, dar aulas, ao mesmo tempo, para alunos das três séries, cumprindo programas diferentes. Enquanto passava lição para uns, explicava o ponto para outros e haja acrobacia, paciência e disposição. Minha irmã cursava já o 3º ano e a professora pedia que ela abrisse um armário que ficava nos fundos da sala de aula e de lá retirasse o cartaz correspondente ao ponto que ela daria ao pessoal do primeiro ano. Isso religiosamente todos os dias letivos.  Seguíamos rigorosamente o método e o esquema da cartilha Caminho Suave, que preconizava a chamada alfabetização pela imagem (“a” a partir de abelha, “b” de barriga, “c” de cachorro, e assim por diante). A professora  afixava num pedestal de madeira, um cartaz colorido e ampliado com o mesmo desenho do livro: Uma beleza. Minha irmã, então, sabendo de minha curiosidade pelos desenhos, não só apanhava no armário o desenho do dia, como às vezes me mostrava, de lá mesmo, os próximos cartazes com as figuras do livro, agigantadas, para meu delírio. No ano seguinte mudamos para Campinas e fui estudar num colégio  estadual próximo de minha casa, num outro esquema, agora de cidade grande. O tempo passou. Jamais esqueci aquela escola, os meus colegas, os recreios que a gente apreciava no pátio, isso quando não passava a boiada ( circunstância comum que nos obrigava a correr para dentro da sala de aula, fechando a porta (pra mor das vacas não entrá e cagá lá dentro). Nem daquela professorinha dedicada, que vinha de fora e morava na Pensão da Lucrécia (única, aliás),  e que às vezes tomava chá da tarde na minha casa. E principalmente jamais esqueci a minha cartilha de alfabetização pela imagem: a minha querida Caminho Suave, de “p” de pato, “r” de rato, “s” de sapo, “v” de vaca e outros bichos ilustrados. Bem, comprei o exemplar, com prazer e nostalgia. E o folheando em casa, com calma, tive uma ideia. Vou dá-lo de presente ao Rafael, meu neto de um ano e oito meses como uma relíquia e, convenhamos, um instrumento de auxílio no seu processo de alfabetização. Isso se não for impedido ou desaconselhado de fazê-lo pela ditadura dos moços ou a arrogância de algum pedagogo metido à besta.

Até amanhã amigos.

P.S. (1)  A obra didática referida, uma cartilha,  teve a sua primeira edição no ano de 1.948 e até meados da década de 1.990 foi referência em alfabetização. Nesse intervalo de quase 50 anos, foram vendidos 40 milhões de exemplares, um fenômeno editorial. Mesmo fora do catálogo do Ministério da educação desde 1.995, a cartilha vende cerca de 10 mil exemplares por ano;
P.S. (2) Em entrevista ao jornal Folha de São Paulo, a autora Branca Alves de Lima (falecida em 2.001), relatou que foi observando a dificuldade de seus alunos, a maioria vindo  da zona rural, que ela criou o método batizado de alfabetização por imagem, unindo o chamado método analítico, ao sintético, o que facilitaria o aprendizado;
P.S. (3)  A cartilha vem acompanhada de instrumentos ou ferramentas de apoio, como carimbos e os cartazes. aos quais me referi no texto acima;
P.S. (4)  Caminho Suave e Cartilha Sodré (de Benedita Stahl Sodré), são os únicos métodos considerados pelos especialistas em pedagogia como realmente brasileiros. O método da Caminho Suave começa pelo estudo das vogais, forma encontros vocálicos e depois parte para a silabação;
 P.S. (5) A imagem da coluna é da capa da cartilha reeditada em 2.011 e foi emprestada de www.livrariacultura.com.br; informações constantes da postagem de hoje foram complementadas com consulta ao site www.wikipédia.com.br



domingo, 27 de abril de 2014

HISTÓRIA DA MPB - ERNESTO E O SAMBA DO ARNESTO

Amigos,

“Samba do Arnesto”, um dos famosos sambas do paulista nascido em Valinhos, Adoniran Barbosa, é um personagem inspirado num parceiro de mocidade do compositor. Em verdade, a figura não se chamava “Arnesto”, mas "Ernesto".  Ernesto Paulella, embora sempre mantendo o sonho de ser advogado (o que lhe valeu, entre os amigos, o apelido de Acadêmico), só  se formou aos 60 anos e advogou durante mais de 30. Morreu este ano, no dia 26 de fevereiro, aos 99 anos, mas desde 2007, por causa de um acidente vascular cerebral, estava afastado, recebendo auxílio da Carteira dos Advogados de São Paulo (CAASP).  O Dr. Ernesto, em longa reportagem que concedeu ao Jornal do Advogado em 2011, falou de sua amizade com o compositor, das histórias que ambos construíram desde os tempos da boemia e de como nasceu o Samba do Arnesto. Confidenciou que a troca do “E” pelo “A” (Arnesto em vez de Ernesto), foi proposital para manter “o estilo único do compositor”  e, mais, que a história é fictícia, segundo ele “fruto da mente fértil e prodigiosa do compositor”,  pois embora tenha morado no Brás, nunca convidou Adoniran, nem qualquer outro colega de bar “prum samba” na casa dele. Decididamente garante que não cometeu a falta (nós fumu e não encontremo ninguém...),  e não mereceu a bronca que se tornou famosa: Você podia ter deixado um recado na porta.....”.

Tchau amigos,

P.S. (1) Grande parte das composições que se tornaram ontológicas na música popular brasileira são inspiradas em personagens e passagens reais. Em outras os personagens são reais, mas as histórias fictícias, como essa do Arnesto, digo, Ernesto. A verdade é que muitos dos personagens anônimos de famosos compositores, acabam ganhando notoriedade pelo sucesso das canções, como é o caso de Helô Pinheiro, que inspirou “Garota de Ipanema”, uma das músicas brasileiras mais executadas no mundo inteiro e que teve versões em vários idiomas;

P.S. (2) Minha amiga, a Desembargadora do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo,  Ligia Bisogni assegura que teria sido a musa inspiradora da composição “Lígia” do saudoso maestro Antonio Carlos Jobim, a quem foi apresentada em certa ocasião,  embora não tenha tido qualquer relação ou envolvimento com Tom.

P.S. (3)  As imagens da coluna de hoje são, respectivamente: 1) do advogado inspirador do Samba do Arnesto, Dr. Ernesto Paulella emprestada do site www.otempo.com.br; 2) da amiga e Desembargadora Lígia Araújo Bisogni, emprestada de www.youtube.com, e 3) da garota de Ipanema, Helô Pinheiro na época em que inspirou a famosa composição de Tom e Vinícius (www.sitesnobrasil.com).







quarta-feira, 23 de abril de 2014

LITERATURA - A MORTE E A IMPORTÂNCIA DA OBRA DE GABRIEL GARCIA MARQUEZ

Sem propor a si mesmo, sem nem saber, demonstrou com sua vida a razão que tinha o pai, que repetiu até o último suspiro que não havia ninguém com mais sentido prático, nem pedreiros mais obstinados nem gerentes mais lúcidos e perigosos do que os poetas” (O amor nos tempos do cólera)

Caros amigos,

Um amor  capaz de subsistir no tempo e de provocar as mesmas emoções quando o destino reencontra o casal no limiar da terceira idade e os corpos já não ostentam o frescor da mocidade, a beleza das linhas estéticas bem definidas e os hormônios já não transbordam pelos poros. Assim foi o romance de Florentino e Firmina que, verdadeiro e não sopitado pelo tempo, vai se realizar numa viagem que acontece somente  51 anos, 9 meses e 4 dias depois da troca do primeiro olhar. Foi assim que me apaixonei por Gabriel Garcia Marquez. Não pelo Gabriel de Cem Anos de Solidão, considerada a mais expressiva obra do autor colombiano morto recentemente, mas pelo escritor do Amor nos Tempos do Cólera, um romance definitivo na definição de meu gosto literário que teve os primeiros contornos na idade madura  e que  hoje  encontra-se razoavelmente consolidado. Com uma incrível capacidade de traduzir sentimentos e emoções do mais expressivo lirismo num cenário hostil típico da América Latina, com as suas eternas questões políticas, sociais e culturais, o romance é, sem favor algum, um dos mais importantes clássicos da literatura universal. A par disso, Gabriel foi um grande intelectual, um grande pensador, um filósofo, um sociólogo, um  político cujas penas souberam, como poucos, retratar a América Latina e seus problemas. A comunidade em geral, de todas as partes do mundo, está de luto e lamenta a morte do autor, aos 87 anos. Pelo conjunto de sua importante obra foi contemplado com o Premio Nobel de Literatura de 1.982 e segundo o nosso escritor Luis Fernando Veríssimo, a obra de Garcia fez o mundo mudar sua visão sobre a América Latina, o que definitivamente não é pouco.
Até amanhã amigos,

P.S. (1) Alguns pensamentos preciosos do escritor: 1)   Nenhuma Medicina cura o que a felicidade não pode curar; 2) Não acredito em Deus, mas tenho medo Dele; 3)  A Sabedoria é algo que quando nos bate à porta já não nos serve para nada; 4)  O sexo é o consolo que a gente tem quando o amor não nos alcança;  5) Todo ser humano tem três vidas: a pública,a privada e a secreta; 6) Não chore porque acabou, sorria porque aconteceu; 7) Não é verdade que as pessoas param de buscar seus sonhos porque envelhecem. Elas envelhecem porque param de buscar seus sonhos; 8) Tudo é questão de despertar sua alma; 9)  Era ainda jovem demais para saber que a memória do coração elimina as más lembranças e enaltece as boas e que graças a este artifício conseguimos suportar o passado. 10) Descobri que minha obsessão por cada coisa em seu lugar, cada assunto em seu tempo, cada palavra em seu estilo, não era o prêmio merecido de uma mente em ordem, mas, pelo contrário, todo um sistema de simulação inventado por mim para ocultar a desordem da minha natureza;

P.S. (2) Experimente esta: “No dia em que a merda tiver algum valor, os pobres nascerão sem cu”. Você achou, como eu, que essa frase deve ter sido proferida pelo Costinha ou pela Dercy Gonçalves, consagrados e desbocados comediantes brasileiros já falecidos. Errou. Quem construiu esse pensamento foi o intelectual Gabriel Garcia Marquez.

P.S. (3) Memórias de Minhas Putas Tristes foi o último romance escrito por Gabriel Garcia Marquez, antes de declarar que deixaria de escrever. Em 2.012, confirmando que ele estava senil, seu irmão declarou encerrada a carreira de escritor do consagrado poeta que vendeu  mais de 40 milhões de livros em todo o mundo.

P.S. (3) A imagem de hoje, do autor, foi emprestada de www.portalohoje.com.br ;



segunda-feira, 21 de abril de 2014

A MORTE DE JOSÉ WILKER, A BUNDA DE VADINHO E A BANANA PARA A CENSURA

Caros amigos,


Estava no Aeroporto de Guarulhos quando fiquei sabendo, por minha filha e pelo telefone, da morte inesperada do ator José Wilker.  Dias antes vi o artista se apresentar no programa Vídeo Show da Rede Globo e ele me pareceu perfeitamente bem disposto e cheio de novos projetos. Fiquei sabendo depois que o coração, “que tem razões que a própria razão desconhece”, como garante o compositor, decidiu parar de madrugada, durante o sono profundo e levar o nosso Wilker para outra galáxia. Viajei naquele dia e só retornei oito dias depois de uma viagem  a Barbados, no Caribe, onde fiquei sem Internet e telefone. Não acompanhei as notícias dos funerais e a repercussão do falecimento. Por certo deve ter sido grande, pois na sua vida artística terrena José Wilker teve grande importância e se pode dizer que era um dos mais relevantes e talentosos atores de sua geração, que, por sinal, é também a minha. Não foi apenas ator. Foi diretor,  narrador, apresentador e crítico de cinema. Quando lembro do artista, me transporto sempre para o dia 03 de janeiro de 1.977. Era o aniversário de meu casamento. O segundo aniversário. E por coincidência, o sétimo  aniversário de matrimônio de minha irmã mais velha, que se casara no mesmo dia e mês, cinco anos antes.  Pois resolvemos combinar, os dois casais, um programa para comemorar a ocasião. Fomos à sessão noturna do saudoso Cine Voga, que ficava na esquina da rua General Osório com a rua Irmã Serafina, no centro de Campinas. O cinema exibia um filme brasileiro, Dona Flor e Seus Dois Maridos, uma película de Bruno Barreto, com roteiro adaptado da obra do mesmo nome de Jorge Amado. Os protagonistas eram de peso. No papel de Dona Flor, a morena  Sônia Braga, com seus cabelos negros longos que desciam pelo corpo escultural sobre a pele jambo. E os dois maridos eram interpretados pelo ótimo Mauro Mendonça (o 2º), como o farmacêutico Teodoro Madureira,  e pelo jovem ator José Wilker, no papel do debochado Vadinho (o 1º,  que já tinha morrido,  mas gostava de aparecer para a viúva e com ela relembrar as relações quentes do casal). Ótimo filme, excelente roteiro adaptado, interpretações primorosas. Inesquecível. É por isso que até recentemente era o filme brasileiro de maior público em todos os tempos, mais de 10.000 espectadores. Só perde ainda hoje pelo segundo Tropa de Elite, um outro clássico do cinema nacional. O mais importante foi reservado, porém, para o final. Na última cena a platéia toda se surpreendeu. Aparecia Dona Flor caminhando por uma das ruas do Pelourinho,  com seu marido Teodoro, e no meio do dois, quem? O Vadinho, na pele do Wilker, pelado, peladinho, com a “bundinha” branca magrela todinha de fora. E olha que estávamos em 1.977. Em plena ditadura militar que gostava de censurar tudo o que podia, em nome da família, da tradição e da propriedade, um trio hipócrita que serviu para convencer a classe média conservadora de que era preciso derrubar Jango e a ameaça de comunismo que ele representava. A “bundinha” branca do Wilker foi assim uma bandeira para o pessoal da nossa geração. Com ela dávamos uma banana para os ditadores que cerceavam a nossa liberdade, nela incluída a liberdade artística, tão indispensável. Saímos do cinema e fomos a um charmoso restaurante que já não existe mais: o Armorial, que ficava ali, logo ali, do outro lado da rua General Osório e que servia pratos incríveis, preparados pelo “Chef  Frances” e que se podia degustar ao som do piano de Arnaud, um músico que fez história também na cidade e que eu não sei se ainda está vivo. Um programa perfeito para os dois casais na aurora de seus casamentos e de suas vidas. Acompanhei, sempre com muito interesse, depois disso, a carreira prodigiosa do jovem Wilker, que gostava muito de cinema, entendia da sétima arte como ninguém e era um dos comentaristas da premiação do Oscar americano pela  sua emissora e pelos canais fechados Brasil e GloboNews.  Wilker também teve uma participação de peso num outro  excelente filme nacional, Bye Bye Brasil, considerado pela crítica como o mais importante da década de 70. Fez mais de trinta novelas e minisséries pela Rede Globo, valendo destacar, dentre outros, o seu papel de Roque Santeiro, na novela do mesmo nome, de Dias Gomes, que foi censurada e só apresentada mais de 10 anos depois. Ganhou fama como o mafioso Giovanni Improtta, na novela Senhora do Destino, que em 2.013 virou filme. Um grande artista, uma grande perda para as artes cênicas brasileiras e para os seus amantes. E para mim, por razões históricas, também a inesquecível bundinha branca, que emprestamos do Wilker e que foi uma espécie de triunfo sobre a opressão de uma ditadura que deixou marcas profundas na nossa geração. Respeitosamente!

Até breve amigos.

P.S. (1) José Wilker participou de 68 filmes, desde 1.965 quando apareceu, em papel secundário e sem que lhe dessem sequer crédito, no filme A Falecida, baseada em peça de Nelson Rodrigues. Dentre os longas, podem ser destacados, além de Dona Flor e Bye Bye Brasil, Os Inconfidentes (1971), Xica da Silva (1976), Jango (1984), Dias Melhores Virão (1.989),
Pequeno Dicionário Amoroso (1.996), Guerra de Canudos (1.997), O Homem do Ano (2.003) e Casa da Mãe Joana (2.008) e Casa da Mãe Joana 2 (2.013);

P.S. (2) As imagens da coluna de hoje são: 1) de Dona Flor e Seus Dois Maridos (1.976) emprestada de veja.abril.com.br,  2) de  Bye Bye Brasil (1.979), de www.yotube.com; 3) de Giovanni Improtta, emprestada de joaoevocespaceblog.com.br.


terça-feira, 15 de abril de 2014

AQUI NÃO É VARA - CAUSAS & CAUSOS


Boa noite amigos,

Hoje vai mais um dos "causos" forenses publicado na primeira versão do livro "Causas & Causos" da Editora Millenium. Os três queridos personagens mencionados neste conto verdadeiro já são falecidos e são muito saudosos para mim. Com eles convivi e aprendi um pouco do que sei ou acho que sei de Direito e da vida. Vai lá:


Ria, e o mundo rirá com você. Ronque, e dormirá sozinho” (Anthony Burgess).


"O Mário Stucchi era um sujeito extraordinário.

Pessoa absolutamente íntegra, reunia incontáveis virtudes, dentre as quais as de excelente marido e pai, embora brincasse, tendo casado com certa idade, que não era pai, mas  avô de seus filhos.

Amigo fiel, íntegro e trabalhador, bom humor constante, desses de quem sempre está de bem com a vida, aconteça o que acontecer.

Era, sim, uma alma absolutamente iluminada.

Não havia ambiente ou situação triste que resistisse à chegada do Mário, que ia logo contando uma piada, brincando, tratando de amenidades.

Se, por exemplo, você o convidasse para um jantar em sua casa, uma festa de aniversário etc., ele vinha com uma infalível garrafa de vinho debaixo do braço e ia logo dizendo:

- Não me lembro se foi você que meu deu essa garrafa. Se foi, na próxima festa você me devolve.

Embora Bacharel em Direito, o Mário, na época do fato aqui relatado, trabalhava no Cartório da 33ª. Zona Eleitoral de Campinas,  que funcionava em dependência do Palácio da Justiça, esse mesmo conhecido hoje como Fórum Central, na rua Regente Feijó, agora  parcialmente desativado.

Certo dia, estando no porão do edifício, onde ficava o arquivo da Justiça Eleitoral, é surpreendido com a chegada do Doutor Maércio Sampaio, então Juiz da 2ª. Vara Cível da Comarca de Campinas, função que cumulava com a de Juiz Eleitoral.

O Dr. Maércio estava de saída, pois tinha sido promovido recentemente para a Comarca da Capital.

Ao lado dele estava um outro senhor, trajando terno, mas o fato é que ele não foi apresentado ao Mário.

Provocativo, o Doutor Maércio, que bem conhecia o Mário Stucchi, indaga:

- Ô  Mário, você já conhece o novo Juiz? Como é que ele é?

 - Olha Dr. Maércio. Eu ainda não vi o novo Juiz, mas estou muito preocupado com ele.

- Por quê?

- Como o senhor sabe, tem duas coisas que eu gosto de fazer. Uma é de trabalhar, outra é de brincar. E eu ouvi dizer que esse Juiz novo não gosta de brincadeira.

Nesse instante, o homem que acompanhava o Dr. Máercio, e que era ninguém menos, ninguém mais, senão o novo Juiz, o saudoso Doutor Manuel Carlos de Figueiredo Ferraz Filho, sem esperar para ser apresentado, com ar sério e voz grave, dispara:

- Pois é senhor Mário, é verdade.  Na minha Vara eu não gosto mesmo de brincadeira.

Meio surpreso com a revelação e a bronca, Mário não se fez de rogado e com a agilidade de raciocínio que lhe era peculiar, responde:

 - Sabe doutor, é que lá em cima onde eu trabalho não é Vara, é Zona.

Sorrisos inevitáveis, embora ainda discretos, o Mário e o Doutor Manuel ficaram muito amigos.

E era mesmo impossível brigar com o Mário."

Até amanhã amigos.

P.S. (1) A caricatura da coluna de hoje foi emprestada de carnaubafotos.blogspot.com.




segunda-feira, 14 de abril de 2014

ITUANO - O PEQUENO GIGANTE CAMPEÃO PAULISTA

Boa noite, amigos,

Com regulamentos enxutos em função da Copa do Mundo, estão chegando ao fim os campeonatos regionais, sem grandes surpresas. O Cruzeiro é campeão em Minas, o Internacional em Porto Alegre, o Bahia na terra dos Orixás e o Flamengo, no Rio, com um gol irregular, já no ocaso do clássico contra o Vasco da Gama,  um erro da arbitragem que muito vai dar o que falar, ainda. Bem, mas não é precisamente esse o assunto relevante. O que merece ser registrado, como novidade, é a grande e boa surpresa no desfecho do Campeonato Paulista da Primeira Divisão. O modesto Ituano, do interior de São Paulo, é o campeão, quebrando uma hegemonia dos grandes clubes e acendendo uma nova esperança nos rumos do futebol brasileiro. Itu, cidade nacionalmente conhecida pelos exageros, onde coisas, pessoas e histórias crescem, criando um mundo gigante no imaginário popular,  viu seu representante, tal como a lenda, crescer no final da competição, eliminando São Paulo, Palmeiras e finalmente, em duas partidas emocionantes, disputadas no Pacaembu, também bater o Santos, tricampeão paulista,  na decisão por pênaltis (7 a 6). É importante assinalar que o clube tem hoje o apoio e a estrutura profissional mínima necessária para dar à Comissão Técnica  e jogadores serenidade e tranqüilidade, na medida em que sabiam que tinham plena assistência e principalmente que os salários seriam pagos em dia,  e que cada um deveria cumprir, em conseqüência,  com respeito e rigor, as suas funções, dedicando-se nos jogos, pensando coletivamente e cumprindo à risca o esquema tático desenhado por Doriva, o jovem e competente condutor da equipe. Tudo isso também se deve - e muito -  a um grande ex-jogador, ídolo de todos os brasileiros, o competente Juninho Paulista. Depois de uma carreira no Brasil e no exterior absolutamente vitoriosa e com títulos importantes, Juninho encerrou essa carreira em 2.010, retornando ao Ituano, no ano em que a equipe, na última rodada, escapou do rebaixamento, virando um jogo, de forma espetacular, contra a Portuguesa de Desportos. A partir dali, o atleta trocou a função de jogador, pela de Diretor de Futebol do clube. Nessa função, foi o responsável pela recuperação das categorias de base e reestruturação do estádio Novelli Junior. O projeto deu certo, sem dúvida, e sem nenhuma grande estrela, mas com  jogadores esforçados, alguns com talento até acima da média, inclusive  para cumprir esquemas, humildade, dedicação e alta estima, essa equipe chega à conquista da láurea máxima do futebol paulista. Sorte! Com certeza, os chamados “Deuses do Estádio” precisam ajudar, mas certamente é indispensável o mérito e a dedicação, aspectos que não faltaram, justificando sim o bom futebol apresentado ao longo do campeonato. Com  uma folha de pagamento de R$400.000,00 (quatrocentos mil reais), incluindo salários dos jogadores e da comissão técnica, o montante é inferior ao salário de alguns jogadores, isoladamente, como o do centroavante Pato, por exemplo, como se comenta. E se os grandes talentos são indispensáveis ao futebol, fica, no entanto, a constatação de que não adianta ter um ou alguns craques ganhando fábulas, pois isso apenas não garante título. E nem se justifica esse inflação exagerada de altíssimos salários, que nem sempre dão retorno (eu diria, hoje, quase nunca) e acabam deixando os clubes com os cofres vazios (isto quando são pagos efetivamente o que também é duvidoso) e sem perspectiva futura. Bem, o Ituano vai receber cerca de R$2.500.000,00 (dois milhões e quinhentos mil reais), pelo título de campeão, quantia essa que somada às rendas obtidas nos jogos finais (cerca de R$1.000.000,00),  dará para garantir a sua modesta folha de pagamento até o final do ano. E vai se preparar para disputar o campeonato brasileiro da série D, pensando no acesso a C, e se continuar com uma política boa e uma gestão eficiente, um dia chegar ao Brasileiro da Série A, como sugere o nosso prezado Juca Kfouri, na sua coluna de hoje. É ir com calma, porém. Mas que o exemplo do Ituano tem que servir às equipes do interior que se sentem desprestigiadas e que lutam com dificuldades para sobreviver e que não acreditam no sonho de um título, isso sim é o saldo positivo deixado por esse  pequeno gigante, da terra dos gigantes: planejamento, investimento nas categorias de base,  gestão eficiente e sustentável e gente comprometida seriamente com o clube do coração.


Até amanhã amigos.

P.S. (1) Eis o time e a comissão técnica que escreveram na história o nome do Ituano e da cidade que o abriga: Vagner, Dick, Alemão, Anderson Salles, Dener, Josea, Paulinho, Rafael Silva, Jackson Caucaia, Cristian, Esquerdinha, Marcinho, Clayson e Jean Carlo. Técnico: Doriva.

P.S. (2)   A cidade de Itu  é a segunda maior cidade da microrregião de Sorocaba, com cerca de 170.000 habitantes. É o 46º município mais populoso do Estado de São Paulo e o 153º do Brasil. Chegou a ser considerada a cidade mais rica do Estado, quando lá residiam os chamados “barões do café e autoridades importantes do país, na época anterior à Proclamação da República. Teve, por isso, importância histórica no processo que conduziu à República, em 1.889. O município completou esse ano 404 anos de existência;


P.S. (3) “Praça da Alegria” era o nome de um humorístico que a antiga TV Paulista, hoje TV Globo, apresentava a partir de 1.957. Nele, o saudoso Manoel da Nóbrega se sentava num banco de uma praça e ali recebia os mais diversos tipos de comediantes, em bizarras situações. Um desses comediantes, Francisco Flaviano de Almeida era de Itu e criou o personagem “Simplício”. O Simplício, quando falava na sua cidade-natal, dizia que tudo ali era maior, era exagerado. Daí, graças ao conterrâneo humorista, Itu passou a ser conhecida em todo o país, como a cidade dos exageros. O programa mudou de nome para A Praça é Nossa. No banco, não mais Manoel de Nóbrega, mas seu filho, Carlos Alberto de Nóbrega. O canal de apresentação: o SBT do empresário Sílvio Santos. Sem os velhos comediantes, mas com uma nova geração de atores que merece ser prestigiada. 



P.S. (4) Na Praça da Matriz a Prefeitura criou, aproveitando a fama adquirida, a chamada Praça dos exageros. Nas imagens da coluna de hoje, emprestadas de www.itu.sp.gov.br e elielsamphoto.blogspot.com, você pode conferir o boneco do personagem “Simplício”, uma formiga e a garrafa de coca-cola, todas em tamanho gigante;

P.S. (5) Há também um orelhão que foi cedido pelo ex-ministro das Comunicações, Higino Corsetti e instalado pela Companhia Telefônica na mesma Praça da Matriz. Em seu discurso,o Ministro afirmou: “O Brasil é grande, mas eu sei que Itu é Maior. E a Telesp não podia deixar de instalar, na cidade, um “orelhão à altura de sua fama”.


P.S. (6)  As outras imagens da coluna são da equipe do Ituano, campeão paulista de 2.014, do goleiro Vagner que defendeu a última cobrança de pênalti batido pelo zagueiro Neto (ex-Guarani) e foram emprestadas de oexpressoregional.com e wwwestadao.com.br.

P.S. (7) Oficialmente, o Ituano tem dois títulos paulistas. O primeiro foi conquistado no ano de 2.002, mas muito contestado porque naquele ano, as equipes da Capital, o Santos e o Guarani disputaram o Torneio Rio-São Paulo e ficaram de fora do campeonato paulista.