sábado, 24 de janeiro de 2015

CRÔNICA - EXAMES DE LABORATÓRIO

Boa noite amigos,


Mudaram os tempos. E o “agora” é tempo em, que por todos os lados, você é pressionado para fazer medicina preventiva. Inda mais se tiver mais de 60 anos e histórico na família de câncer ou problema cardiológico. E alguém não tem uma ou outra coisa?  Conheci muita gente que morreu sem nunca ter feito um hemograma. Que não soube, nesta existência, o que significa glicemia ou colesterol e nem sequer conheceu o seu tipo sanguíneo.  Gente que comeu de tudo, que bebeu de tudo, que fumou e abusou à vontade e que bateu a cassuleta (  será que é com dois "ésses" ou com c?). com mais de 80, 90 anos. Mais isso já era. Hoje você não corre esse risco, pois os programas de TV, os amigos, os filhos e netos te convencem que é melhor você descobrir cedo se tem alguma doença grave, porque as chances de cura são maiores, e de você abandonar a vontade de viver, por conta de uma depressão, incomensuráveis.  Todo ano, você é instado pela empregadora a fazer  o tal Chek up, que para valer mesmo tem que contar com  um chek list de exames de todos os tipos. Pois bem, foi assim que em certa manhã, lá estou eu no laboratório com as benditas guias da Unimed, esperando a minha vez de ser atendido:  - O  Sr. fez sexo nas últimas 48 horas? Andou à cavalo? As perguntas se sucediam firmes na boca bem feita da jovem atendente do laboratório. E em voz alta. De soslaio observei o ambiente e notei que várias pessoas disfarçavam, mas aguardavam ávidas e sádicas, sem dúvida, as minhas respostas. Só de sacanagem. Emendei uma sucessão de “nãos”, sem saber bem o propósito dessas perguntas. Afinal, o que tem a ver o sexo com os exames de hemograma? E será que andar à cavalo altera a glicemia? E o toque retal, modifica o PSA?  De cabeça baixa, constrangido, rapidamente só me restavam algumas hipóteses de consolação: Já pensou se ela perguntasse se fiz sexo nas últimas 48 semanas? E nos últimos 48 meses? O Sr. trouxe as amostras para os exames de urina e fezes? Não, respondi. Na verdade, tinha esquecido. Aliás, nem isso. Não cheguei propriamente a olhar na guia a relação dos exames que o meu facultativo de praxe tinha solicitado. Não tive tempo. Bom, como não enviei o material, ela me advertiu que os exames só ficariam prontos depois que eu entregasse as amostras. E mais advertências: O material tem que ser colhido e logo em seguida entregue, viu? Quanto às fezes não precisa exagerar. Basta um pedacinho, que será suficiente. E quanto à urina? Bem também não precisa uma grande quantidade. Acorde pela manhã e colha a primeira urina. Mas, atenção, despreze o primeiro jato. Pensei, cá comigo: Moça,  digamos que eu não tenha propriamente um jato, nessa minha idade. Pode ser em gotas? E tem mais: não estou em condições de desprezar nada. Mas, vou tentar. Saí do laboratório cheio de interrogações e dúvidas. Sem saber como, nem por que. Mas considerei que pelo menos, ao menos, esses donos de laboratórios poderiam substituir essas mocinhas jovens, bonitas e implacáveis, por algum marmanjo mais experiente e piedoso. Que não precisasse fazer determinadas perguntas, nem advertências. Muito menos em altos brados.  Que considerasse que as respostas seriam óbvias. E que pudesse me explicar, ao menos, o que tem de ver o cu com as calças!

P.S. Ah! Tive vontade, mas não perguntei naquela questão relacionada com o sexo nas últimas 48 horas, se punheta valia.



Até amanhã amigos.


P.S. (2) A imagem da coluna de hoje foi emprestada de forum.jogos.uol.com.br

terça-feira, 20 de janeiro de 2015

PUC -CAMPINAS - RETRATO DE UMA ÉPOCA E O CAMINHO DO BEM E DO MAL.

Boa noite amigos,

1) O estimado advogado,  Ricardo Ortiz de Camargo, prezadíssimo ex-aluno e grande amigo, seguidor desta coluna, me enviou e.mail  de felicitações para o ano novo e, no mesmo ensejo, transcreveu uma curiosa publicação que consta da coluna Há 50 anos atrás do jornal Correio Popular, edição de 12 de janeiro de 2.015. Como se sabe,  a Pontifícia Universidade Católica de Campinas, antes de receber, do Vaticano, pelo Papa Paulo VI,  o título de Pontifícia, o que se deu no ano de 1.972, se identificava simplesmente como Universidade Católica de Campinas, fundada em 1.955.  O seu primeiro e saudoso reitor, Monsenhor Emílio José Salim, de memória sempre exaltada pelo seu descortino,  inteligência, sensibilidade e visão futurista, há 50 anos atrás,  atendendo ao apelo dos conservadores, baixava uma curiosa portaria, proibindo o uso, pelos universitários,  de cabelos longos e barbas. O Correio Popular, edição de 12 de janeiro de 1.965, publicava então a notícia nos seguintes termos literais: “Repercutiu de forma favorável, notadamente entre os conservadores, a portaria baixada pelo monsenhor Emílio José Salim, proibindo a matrícula e frequência de alunos cabeludos e barbudos na Universidade Católica de Campinas. O ato do magnífico reitor tem por objetivo por um paradeiro ao que se entende péssimo gosto de se apresentar. O documento da Reitoria disciplina, também, o modo de se vestir dos estudantes que não poderão mais trajar-se displicentemente e usar sapatos sem meias. Entendem os conservadores que a medida é de grande alcance, pois, pelo menos os universitários de Campinas, passarão a ter melhor apresentação, deixando de apresentar vastas cabeleiras que, à distância, costuma confundir com elemento do sexo feminino.”;
Retrato de uma época, sem dúvida. A proibição, no entanto, se fundava apenas no bom ou mau gosto, segundo a notícia, e na preocupação de evitar confusão, à distância, entre os universitários do sexo masculino e os do sexo feminino.O curioso é que nem Jesus Cristo teria escapado da proibição e da pecha de mau gosto pelo uso suposto de cabelos longos.
  
2) O Prof. Peter Panutto, atual Diretor da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Campinas, navegando pelos mistérios da Internet, acabou localizando a imagem de uma placa de rodovia indicando a flecha de "seguir adiante" para o caminho de Brasília e Goiânia,   e, para o acesso a  uma outra desconhecida localidade chamada “Professor Jamil” o ingresso à direita (a foto ilustra a coluna de hoje).  Logo, diz ele, se lembrou aqui do distinto, que dentre as múltiplas atividades, está a de professor da querida Faculdade, como sabem os senhores, há mais de  35 anos.  Daí ter me enviado (acredito, em homenagem), a curiosa placa. Em resposta, sugeri ao culto professor que possibilite o uso didático da  imagem para ilustrar, nas aulas de Filosofia do Direito,  a dicotomia entre o Bem e o Mal.  O Mal, certamente,  representado pelo caminho de  Brasília. Já para trilhar o Bem, segundo minha proposta, bastaria ingressar à direita;


3) Professor Jamil é o nome de um município do Estado de Goiás, que se chamava, no passado, Campo Limpo. Fica localizado no entorno de Goiânia, entre os rios Meia Ponte e Dourados. Sua população, segundo o IBGE, era, em 2.014, de apenas 3.390 habitantes. O prefeito atual é Ney Fábio de Morais, eleito para o quadriênio 2.013-2.016. O gentílico do município é jamilense. A indústria leiteira é a sua principal atividade econômica;

Até amanhã amigos,



quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

JE SUIS CHARLIE - UMA REFLEXÃO NECESSÁRIA

Boa noite amigos,

O mundo se chocou com o atentado que vitimou doze pessoas, deixando lesões corporais em outras dez, em Paris, nos primeiros dias deste ano de 2.015, cometido por jovens  franco-argelinos  fundamentalistas e justificado como represália a cartunistas e jornalistas da revista satírica  Charlie Hebdo, pela publicação de charges satirizando o profeta Maomé. O ato de terrorismo e suas consequências evidentemente foram lamentados e censurados em todo o Ocidente, pelo seu despropósito e barbarismo, não havendo voz que se levante para sustentar a razoabilidade e proporcionalidade da resposta que os fanáticos pretenderam dar àquilo que consideraram uma provocação e uma heresia. Logo, entre movimentos populares e políticos vindos de todos os continentes, surgiu um jovem compositor francês que, pela Internet, postou um vídeo com sua música feita para homenagear os artistas mortos no atentado. A balada sentimental, questionando a irracionalidade do ato, acaba com uma frase que se tornou, rapidamente, bordão em todos os meios de comunicação, inclusive e principalmente nas redes sociais: Je suis Charlie! (Eu sou Charlie).  O Je suis Charlie ganhou também as ruas, os cartazes, o coração dos homens de bem, em profunda solidariedade com as  vítimas. Anteontem, na cerimônia do Globo de Ouro, o segundo mais importante prêmio de cinema americano, vários dos contemplados reproduziram o bordão “Je suis Charlie”, em discursos e cartazes. Não vi, porém, a não ser aqui e acolá, manifestação questionando o direito de editores e jornalistas do meio de comunicação,  de ofender católicos, judeus ou muçulmanos, com suas anedotas e desenhos. Destaco, porém, alguns lúcidos artigos e entrevistas que acompanhei e endossei. O Delegado aposentado e professor de Direito, Carlos Alberto Marchi de Queiroz, escreveu um excelente artigo intitulado Tragédia Anunciada, na edição de 3ª. feira, 13 de janeiro de 2.015, do jornal Correio Popular, de Campinas, e que circula por todo o Estado, por meio do qual questiona a realidade sociopolítica francesa e o seu envolvimento com os lemas da Revolução Francesa. Observa o articulista que o direito constitucional francês garante a liberdade de expressão de forma ilimitada e que, sob esse manto, a revista, especialmente depois do atentado à bomba sofrido quatro anos antes, “não poupa, em suas charges, de forma contundente, expoentes cristãos, judeus e muçulmanos. Edições da revista estamparam em suas capas a Virgem Maria, em trabalho de parto, dando a luz ao Menino Jesus, o papa Francisco, no Rio, vestido de cabrocha, o profeta Maomé, em situações inusitadas, assim como figuras históricas judaicas em comportamento incomuns, desconsiderando valores cristãos, judeus e muçulmanos, de pesos diferentes cuja tolerância religiosa é tão flagrante quanto o azeite na água.  Em entrevista concedida à repórter Elaine Trindade, coluna “Mônica Bergamo”, da Folha de São Paulo, a francesa Alexandra Baldeh Loras, de origem muçulmana e judaica, que vive no Brasil como consulesa de seu país em São Paulo, analisou com propriedade a contradição entre essa França supostamente acolhedora e plural, como se define e difunde, e  o distanciamento,  preconceito e depreciação que os franceses tradicionais manifestam em relação aos estrangeiros, inclusive aqueles oriundos de suas ex-colônias, que fingem abraçar incondicionalmente e contra os quais se cometeram atrocidades no passado.  E considera  que a França ainda precisa se assumir como nação multicultural e multirracial  para evitar que alguns de seus filhos de ascendência árabe e africana sejam adotados pelo terrorismo. Lembrou ainda que quatro dias antes do atentado em Paris, o grupo Al-Quaeda cometeu outro atentado, com um carro-bomba no Iemen, que matou 37 pessoas. Mas o mundo praticamente não tomou conhecimento desse ato e nem revelou solidariedade às vitimas e familiares. Por quê? Pessoas de segunda classe? De terceiro mundo?  Caros amigos, é indiscutível que a religião é assunto de vida privada, competindo a toda Nação que se diz democrática, a garantia de liberdade de culto. Por outro lado, é indispensável que o Estado moderno, dito democrático, ao garantir o direito subjetivo de cada cidadão de professar ou não qualquer religião, se liberte das amarras de seus fundamentos. O laicismo do Estado é, ao lado do respeito ao direito individual de crença ou descrença, um dos fundamentos do Estado da pós-modernidade.  Mas, ao consagrar a liberdade de culto e se afastar de influência de qualquer deles, enquanto Estado, zelando para que os extremismos não comprometam o direito de autodeterminação ligado à profissão de fé, esse mesmo Estado tem que regrar a liberdade de expressão, que não pode ser ilimitada, a ponto de permitir que se ofendam valores, dogmas e sentimentos religiosos ou laicos de quem quer que seja.  Mario Vargas Llosa, escritor, dramaturgo e jornalista peruano, Premio Nobel de Literatura em 2.010, um intelectual confessadamente liberal, defendeu, em artigo publicado pelo jornal El País, de Madri, em junho de 2.003, o direito do governo francês proibir o uso do véu islâmico nas escolas públicas, justamente em nome da liberdade, por paradoxal que possa parecer,  argumentando que “os direitos humanos e as liberdades públicas e privadas garantidas por uma sociedade democrática estabelecem um amplíssimo leque de possibilidades de vida que possibilitam a coexistência em seu seio de todas as religiões e crenças, mas estas, em muitos casos, como ocorreu com o cristianismo, deverão renunciar aos extremismos de sua doutrina  - monopólio, exclusão de outro e práticas discriminatórias e lesivas aos direitos humanos – para ganharem o direito de cidadania numa sociedade aberta”[1]. E é exatamente o equivocado extremismo de uma garantia constitucional ampla e irrestrita de liberdade de expressão, que também não pode ser admitida, num mundo em que liberdade  e respeito podem e devem coexistir. Por fim, em entrevista concedida hoje, o Papa Francisco, sem aludir especificamente ao episódio (e nem precisaria, obviamente) sustentou que ninguém tem o direito de ofender ninguém, em nome da liberdade de expressão e proibição de censura. E ilustrou o seu argumento, provocando o jornalista: Se você ofender a minha mãe,  provavelmente eu lhe darei um soco. O “Je Suis Charlie”, portanto, antes de refletir um repetitivo bordão em solidariedade à vida dos jornalistas e chargistas franceses mortos, e em protesto contra o absurdo do ato terrorista, é perfeitamente aceitável. Mas para legitimar  uma liberdade de expressão que não cede, nem encontra limites mesmo na ofensa, na provocação, no insulto, na sátira  a deuses e profetas, dogmas, crenças e fés, não pode ser endossado. Nenhum direito é ilimitado, num mundo que pretende ser justo e democrático.  A liberdade de expressão, portanto, tem que ser exercida em consonância com as exigências éticas e respeitar, por isso, valores individuais e sociais que as nações mais avançadas do mundo, dentre as quais a França, assinalam e garantem, tanto quanto a liberdade de expressão, como integrantes do rol dos "direitos humanos". 

Até  amanhã amigos.

P.S. (1) A imagem da coluna de hoje é de atores e atrizes exibindo cartazes de solidariedade às vítimas e à revista,  durante a cerimônia da entrega dos prêmios do Globo de Ouro e foi emprestada de www.mirror.ao,uk.

P.S. (2) Muitas das imagens que vi na Internet reproduziam as charges ditas ofensivas. Por razões óbvias, não escolhi nenhuma delas para ilustrar a coluna.





[1] O artigo está publicado na página 92 da 1a. edição  do livro A civilização do espetáculo – uma radiografia do nosso tempo e da nossa cultura, de autoria do autor, traduzido por Ivone Benedetti e publicado pela Editora Objetiva,  Rio de Janeiro.