sexta-feira, 24 de dezembro de 2021

UM CONTO: PRESENÇA DE ANITA.

 

Boa tarde amigos.


O funcionário que limpava o banheiro parou para olhar a cor amarelada dos meus olhos e das minhas lágrimas,  que ficaram marcadas no papel-toalha disponível, com o qual os enxuguei. Absorto, deve ter pensado com seus botões: “que raio é isso?” De soslaio, percebi a estranheza do rapaz e quis sacanear. Há menos de quinze minutos deixara o consultório do meu amigo Cleso, oftalmologista, que durante a consulta de rotina utilizara um colírio de cor amarela,  indicado para verificação da pressão ocular e para diagnóstico de lesões do segmento anterior do olho. É estéril e logo o colorido, lavado simplesmente com água, desaparece. Lembrei-me que na semana anterior havia visitado meu gastro, com quem estava em falta por causa do afastamento imposto pela pandemia. Queixei-me de algumas supostas irregularidades no material decorrente de minhas evacuações e ele, além de mandar a secretária preencher a guia do plano de saúde para a minha adiada colenoscopia, que agora eu faria “na marra”, como deixou claro, com o seu silêncio revelador, me mandou tomar, por três dias, um vermífugo chamado Anitta. Os comprimidos têm a cor amarelada pela utilização, na fórmula do medicamento,  de elementos com essa coloração e, por isso,  durante o uso pelo paciente,  a urina apresenta-se fortemente amarelada ou num amarelo-esverdeado.  A cor volta ao normal após a cessação do uso. Voltando àquele cenário do banheiro fiz de conta que ignorava  a curiosidade do jovem faxineiro. Entrei num dos mictórios e urinei. A urina, ah, saiu bem amarela, como acontecera naqueles dias. Não dei descarga, de propósito. Logo que deixei o mictório, o moço entrou para limpar e deu de cara com aquela urina que, como as lágrimas que saíram dos meus olhos e mancharam o papel-toalha, era intensamente amarela. Voltei imediatamente e me desculpei pelo fato de não ter dado descarga. O rapaz só observava e não dizia palavra. Mas, à medida em que eu me aproximava ele recuava. Sua feição misturava surpresa, curiosidade e temor de que eu pudesse estar contaminado por alguma doença estranha e letal.  Voltei a ele e disse sorrindo: - Presença de Anitta. Lavei as mãos e saí. Certamente ele não entendeu nada. Pode ter pensado na cantora Anita, mas e daí, que relação havia entre a sensual artista e as lágrimas e urina daquele misterioso senhor? Não, não tinha idade para ter assistido a minissérie que consagrara a atriz Mel Lisboa. E nem poderia imaginar que um remédio para vermes podia se chamar Anitta. Com dois “tes”, ainda.  Mais ou menos na base do  “que teria a ver o cu com as calças?”

Forte abraço amigos e um feliz e iluminado Natal. 

    

 P.S. A imagem da coluna de hoje é da atriz Mel Lisboa, protagonista da minissérie global "Presença de Anita" exibida no ano de 2.001.

 

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