quinta-feira, 25 de setembro de 2025

CORINTHIANS E TRANSPLANTE DE CORAÇÃO.

 

Boa tarde amigos, 

O campeonato paulista de futebol foi o primeiro certame regional do país iniciado no distante ano de 1.902, pela Liga que hoje corresponde à Federação Paulista de Futebol. Decorridos mais de 120 anos da tradicional competição, o Corinthians Paulista aparece como o clube que mais títulos obteve (são 31, com o de 2.025, contra 26 do Palmeiras, segundo colocado).  No entanto, o maior jejum de títulos relevantes como esse (excluídas algumas Copas e Taças, sem expressão) foi experimentado exatamente pelo Timão, que venceu o certame no ano do IV Centenário de São Paulo, em 1.955, numa final contra o arquirrival Palmeiras e só voltou a ser campeão paulista no ano de 1.977, ou seja, mais de 22 anos depois, alimentando, nesse interminável intervalo,  a paixão, o  sofrimento e o fanatismo de milhões de torcedores. Numa final épica com a equipe da Ponte Preta de Campinas, um timaço na época,  aconteceram três partidas, todas marcadas para o Estádio do Morumbi. O Timão venceu a primeira por 1 a 0, gol de Palhinha,  mas perdeu a segunda, por 2 a 1, com gols de Dicá e Ruy Rei e Vaguinho, respectivamente. Na terceira e polêmica partida, apitada pelo não menos polêmico árbitro, Dulcídio Wanderley Boschillia, falecido em 1.998, o atacante Ruy Rei da Ponte Preta foi expulso aos 16 minutos do primeiro tempo, depois de reclamação considerada acintosa contra a marcação de uma falta para o adversário.  Muitas especulações a respeito, dirigidas tanto ao atleta, quanto o árbitro, ventilavam a possível “compra” de um ou outro para favorecer a equipe paulistana. O que se viu no apito final, foi algo inimaginável. Muitos torcedores invadiram o campo e foram festejar a conquista abraçados aos jogadores e cartolas, dançando, chorando, de joelhos para pagar promessa, outros empunhando terços e crucifixos. O famoso comediante Amácio Mazzaroppi,  fiel corinthiano, lançou, no ano de 1.966, a comédia "O Corintiano", que foi grande sucesso de público e bilheteria nos cinemas. O filme, inclusive, foi exibido várias vezes, no Museu do Futebol, sediado  no estádio do Pacaembu. Em 26 de maio de 1.968, ou seja, sete anos antes do título de 77, o Dr. Euryclides de Jesus Zerbini, realizava no Brasil, o primeiro transplante cardíaco, no Hospital das Clínicas da Usp,  cerca de apenas cinco meses depois que o médico sul-africano, Christiaan Barnard realizara a primeira cirurgia de transplante cardíaco do mundo.  Para enfatizar o progresso expressivo da medicina e ilustrar a paixão e o sofrimento dos corintianos com o jejum interminável,  o saudoso Sílvio Santos gravou uma marchinha de Carnaval nominada de “Transplante de Coração”, mas mais conhecida como “Coração Corintiano”; A marchinha de carnaval tinha um estribilho logo decorado pelos foliões que dizia: Doutor, eu não me engano, meu coração é corintiano”  E prosseguia: “Eu não sabia mais o que fazer/troquei meu coração cansado de sofrer. Para concluir: “Ai doutor eu não me engano/botaram outro coração corintiano.” E mal se sabia que o tal jejum duraria ainda mais nove longos anos.

 

Abraço amigos.

 

E.T. – A imagem da coluna de hoje é propaganda do filme brasileiro “O Corinthiano”, comédia estrelada pelo genial ator, produtor e cineasta corinthiano, Amacio Mazzaroppi, 

 

 

 

terça-feira, 16 de setembro de 2025

ESTOICISMO E TERAPIA COGNITIVO-COMPORTAMENTAL

 

Boa tarde amigos,

Um Café Com Sêneca (capa).

O mundo, diria minha avó sobre  a geração subsequente à sua, anda de “pernas para o ar”, bordão antigo que ilustrava a concepção de que tudo estaria mudando, revirado ao avesso, incluindo os costumes e valores. A verdade, porém, é que a  história se repete e em ciclos.  É que o planeta Terra, com seus habitantes naturais, continuam com os mesmos problemas e questionamentos das épocas mais remotas, o que segundo a  observação de David Fideler[1]  “No fim das contas, a época de Sêneca é a nossa época. Ele é nosso contemporâneo e compartilhamos profundamente das mesmas preocupações.”  Tenho notado, nas minhas andanças pelas livrarias da vida, ter crescido significativamente a publicação e o consumo de obras sobre o estoicismo, movimento filosófico que teve em Sêneca (4.a.c.-65 d.C.), um de seus precursores. Esse fascínio por essa corrente filosófica muito se explica, no nosso modo de ver, pela necessidade das novas gerações, não só  discutir os mistérios da vida, como mero exercício de contemplação, como também a de experimentar, na prática, a vivência da chamada “vida que vale a pena ser vivida”, tal como apregoada pelo estoicismo. Envolvendo essencialmente  treino, o estoico defende  uma filosofia prática como o budismo, o que implica em  “colocar as soluções em uso para que funcionem”. O estoicismo nos convida a viver uma vida honesta, ética, com respeito à natureza, sem sofrimento, baseada no fato de que as coisas não são boas,  nem ruins, são como são e que o problema são as crenças e os sentimentos que nutrimos em relação a elas.  A preocupação (pré-ocupação) é um grande desafio do homem moderno, o que justifica a epidemia mundial da ansiedade, que parece ser o grande mal do século. Mark Twain, ironizando acerca da problematização mental sobre o futuro, afirma “Sou um homem velho e passei  por muitos problemas, mas a maioria deles nunca aconteceu.” Atribui-se à Sêneca, ensinamentos sobre o autocontrole e a necessidade de abandono dos fenômenos puramente psicológicos ou imaginários, assim consideradas as preocupações com o futuro ou qualquer espécie de arrependimento sobre o passado, sentimentos que apenas se prestam às emoções negativas, porquanto nenhum deles existe mais no mundo real. Essa maneira de vida negativa cria o medo, um medo inexplicável, que nos paralisa e nos abala profundamente. [2]Não ignorando, nem desprezando as emoções, admitindo existirem, ao lado das "doenças do corpo", "as doenças da alma", que devem ser tratadas, o estoicismo é muito próximo da terapia denominada hoje como cognitivo-comportamental, fundada pelo psicoterapeuta,  Alberto Ellis que ao iniciar o tratamento com novos pacientes, dava a eles, uma cópia da máxima estoica “Não são as coisas que nos perturbam e sim as crenças em relação a elas.”. E Laurence Becker, ainda a respeito da mesma terapia, afirma peremptoriamente que “as origens filosóficas da teoria cognitiva  podem ser rastreadas até os filósofos estoicos”. Com forte respaldo científico, esse tipo de terapia, comum nos dias que correm, tem se revelado eficaz no tratamento de diversos transtornos, como a depressão, a ansiedade generalizada, a insônia e as fobias em geral. Vale a pena se instruir um pouco tanto sobre a filosofia milenar dos estoicos, como sobre a terapia cognitivo-comportamental, a qual tem no estoicismo e seus conceitos,  o seu embrião e embasamento. O livro de David Fideler (Um Café com Sêneca – um guia estoico para a arte de viver), com  tradução de Robin Waterfield, da editora sextante, é uma ótima oportunidade de conhecer tanto essa linha da filosofia voltada para a busca da solução pragmática para o tratamento dos chamados “males da alma”, como  a terapia cognitivo-comportamental, estruturada para obter a mudança do paciente, necessária à modificação de seus sentimentos e forma de encarar as dificuldades próprias da vida de todos nós. 

 

 Boa noite amigos.

 

 



[1] Um Café Com Sêneca – Um guia Estoico para a arte de Viver – tradução Heci Regina Candiani, 1ª. edição, Rio de Janeiro, Sextante Editóra, 2.022, p. 24.

[2] “Como o passado e o futuro estão ausentes e não podemos sentir nenhum deles só as emoções, as oponiões ou a imaginação podem ser fonte de dor.”

sábado, 10 de maio de 2025

POXA!


Amigos, boa tarde.


Imagem da publicidade da novela
Garota do Momento, um sucesso
de audiência na TV Globo.

Acordei neste sábado pedindo para a Alexa da minha cabeceira tocar sambas antigos. Logo na segunda música, identifiquei uma canção de Benito Di Paula, dos anos 70, cujo título é Poxa. Os menos jovens certamente vão se lembrar da letra delicada e cadenciada: Poxa, como foi bacana te encontrar de novo/Curtindo um samba junto com meu povo/ Você não sabe como eu acho bom/. Imediatamente me ocorreu que há muitos anos não ouço ninguém usar a expressão Poxa! Teria “caído de moda?” na gíria usada no meu tempo de moço. E se o verbete Poxa não se ouve mais, teria sido substituído integralmente  por Porra? Já esse último se escuta a toda hora, em todo canto e campo, a ponto dos canais de televisão nem se preocuparem em tirar o som quando o convidado, entrevistado ou o “professor” (tratamento atribuído pelos jogadores de futebol ao seu técnico), soltam a expressão, indignados com o gol certo perdido ou a cagada do zagueiro, no gol do adversário. Bem fui procurar nos dicionários mais prestigiados o significado de ambas as expressões, no meu jeito antigo de observar as comparações entre os lexicógrafos, no estilo comparativo e agora já anacrônico e artesanal, esperando concluir que: ...”O Aurélio cita a expressão, blá, blá, blá.”  Já o Caldas Aulete considera que...........” Que nada! A IA já entrou em ação e mandou logo essa:  "Poxa" e "porra" são duas interjeições em português que expressam emoções, mas com nuances e contextos diferentes. "Poxa" é mais suave e usada para expressar surpresa, tristeza, aborrecimento ou admiração, enquanto "porra" é uma palavra vulgar e forte, utilizada para expressar raiva, irritação, descontentamento ou espanto.”  Falou! O certo é que as expressões não devem ser usadas como sinônimas, embora “porra” seja citada, em alguns dicionários, como um dos correspondentes de “Poxa", que por sua vez é destacada como um eufemismo de “Puxa”.  A delicadeza de uma não se encontra na outra. Mas o fato é que o dia-a-dia o verbete “porra” ganhou infinitos significados, como o tal de “trem” para os mineiros, uai!, extrapolando, em muito, expressões de raiva, irritação, descontentamento ou espanto. Na oração   -   “como funciona essa porra, irmão?” é utilizada como substantivo, no lugar do objeto que o sujeito não conhece ou não sabe, ou não lembra o nome. Em:  “não entendo porra nenhuma dessa matéria”  é usada para afirmar a completa ausência de entendimento sobre a matéria lecionada ou estudada. Na Bahia, é usada também como um elogio, exaltação a algum ato, coisa ou qualidade da coisa. A Folha de São Paulo, edição de 15 de outubro de 2.013, registrou a seguinte assertiva: - "Eita liquidação da porra”.  Conclusão: enquanto a palavra Porra vai ganhando, a cada dia, um campo vasto de utilização, gerando sinônimos quase infinitos, deixando de lado o viés pornográfico que já teve no passado ou o seu sentido mais puro (esperma, sêmen, órgão sexual masculino), o educado “poxa” vai perdendo prestígio como uma delicada manifestação de carinho, de saudade, ou de respeitosa expressão de insatisfação. E se você, por acaso, acabar utilizando a última, corre o risco do seu netinho rir e  advertir: “Não é poxa vovô, é porra.” Ou então, expor o seu estranhamento, assim literalmente:  “- Vô que porra é essa?”

Bom final de semana e parabéns as mães de todo o mundo pela glória e nobreza da maternidade.

P.S(1) – A direção da novela “Garota do Momento” ora exibida pela TV Globo, no horário das 18,25 horas, tem sido cuidadosa na utilização, pelos personagens, de linguagem e gírias que vigoravam em nosso país, ao tempo em que se passa o folhetim, mais precisamente, no final dos anos 50, início dos anos 60. Mas nesta semana o personagem Raimundo (Danton Mello),  para meu espanto, disse que uma certa pessoa já chegara "causando". O verbo “causar” tanto na época da novela, como até hoje, é transitivo direto e eventualmente bitransitivo ("O discurso do Presidente causou apreensão entre os seus eleitores"). Recordo perfeitamente que lá pelos anos 90 ou 2.000, eu indaguei de um dos meus alunos que se referia a alguém como pessoa que estaria “causando” e ponto final.   o seguinte: “Está causando o que?”, sem entender essa gíria moderna, mas  que não existia, absolutamente,  ao tempo em que se passa o folhetim. 

 

 

  

domingo, 4 de maio de 2025

BOI, BOI, BOI, BOI DA CARA PRETA




Bom dia amigos,

A morte de Nana Caymmi nesta semana foi bastante sentida, tanto pela classe artística, parentes e amigos, como pela legião de fãs que a cantora construiu durante seus 84 anos de vida. Dona de um timbre vocal ímpar, Nana se notabilizou pelo extremo bom gosto na escolha do repertório e pode ser considerada a mais especial intérprete das canções do pai, o compositor Dorival Caymmi. A propósito do nosso saudoso Caymmi, Nana cantou como ninguém o Acalanto do pai que o pessoal todo da minha geração e, talvez, da geração seguinte, de minha filha e genro, conhece como música de ninar. /É tão tarde, a manhã já vem/Todos dormem, a noite também/Só eu velo por você, meu bem/ Dorme, anjo, o boi pega neném/Lá no céu deixam de cantar/Os anjinhos foram se deitar/Mamãezinha precisa descansar/Dorme, anjo, papai vai lhe ninar. E aí o desfecho inusitado: boi, boi, boi/boi da cara preta/pega essa menina que tem medo de careta/ Como assim, é sério que é para assustar a menina mesmo? Bem a canção foi composta por Dorival para sua primogênita, ou seja, a própria Nana, no ano de 1.942, mas só ganhou uma gravação de estúdio em 1.960. Imagino que hoje a blitz do politicamente correto teria muitas objeções contrárias a essa letra, algumas supostamente sugerindo incidência do compositor mesmo em normas criminais. A defesa dos animais veria aí uma ofensa contra a dignidade do boi, que não existe para assustar ninguém, muito menos criança. E a cara preta do boi seria preconceito ou mesmo racismo? Mas Dori era negro e em sua defesa poderia invocar a inexistência de crime de autopreconceito ou autoracismo. Por fim, com certeza ele não escaparia do crime de tortura contra criança previsto no artigo 1º, inciso II, da Lei 9.455/97, ainda com a agravante de crime contra descendente, como decidiu recentemente a 5ª. Turma do STJ. Contudo, sites especializados na vida de ambos (pai e filha) garantem que Nana nunca teve medo de nada. Sem papas na língua certamente botaria esse boi de cara preta pra correr. E aí? Crime sem vítima ou crime de maltrato a animal? 

Até mais amigos.

sábado, 22 de março de 2025

O REMAKE DE "VALE TUDO"

 

Boa noite amigos, 

Imagem de Beatriz Segall a Odete Roitmann
da versão originária da novela.

A Rede Globo de Televisão, no seu centenário, e a TV Globo,  no seu sexagésimo aniversário,  resolveram apostar no remake de uma de suas notáveis novelas do passado, para superar a crise decorrente da perda de audiência e da concorrência com a diversificação dos streamings. E assim, a eleita foi VALE TUDO, novela de Gilberto Braga e Aguinaldo Silva,  que em 1.988 e 1.989, anos de sua exibição, atingiu médias elevadas de audiência e praticamente parou o Brasil no capítulo em que se revela a autoria do assassinato da vilã Odete Roitmann  (Beatriz Segall). Andei lendo que na nova versão, a escolha para essa personagem, não foi fácil,  e várias de nossas experientes e grandes atrizes foram cogitadas, incluindo Fernanda Torres, que não pode aceitar o convite por causa das viagens pelo mundo na divulgação do filme “Ainda estou Aqui”, película que recebeu mais de quarenta prêmios, incluindo o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro. No final, a escolha recaiu sobre Débora Bloch, cujo talento e competência na dramaturgia é incontestável. A tarefa, contudo, para qualquer uma que fosse eleita, seria árdua e desafiante, diante da antológica criação da personagem pela hoje falecida atriz Beatriz Segall, a ponto de ser impensável e até, digamos, impossível separar uma da outra. Vários atores do novo elenco, ouvidos, incluindo a autora da adaptação, Manuela Dias, fizeram questão de ressaltar a atualidade do enredo, decorridos mais de trinta anos. Bem, versando a novela sobre questões éticas (para vencer na vida qualquer meio é aceitável? Vale tudo?), associados às carências ou contingências humanas de ontem e de hoje (o alcoolismo invencível da sensível e carente personagem Heleninha, tão bem desempenhada pela  veterana Renata Sorrah), a obra estaria mesmo sempre atualizada, como continuam atuais, quinhentos anos depois, as peças do maior dramaturgo inglês de todos os tempos, Sir William Shakespeare, exatamente pela abordagem de temas universais e atemporais decorrentes de  comportamentos e conflitos típicos do ser humano,  desde o surgimento da espécie há 200.000 anos.  Por outro lado, esse nosso Brasil não mudou quase nada nesses trinta anos decorridos. A manutenção da trilha sonora de abertura, com Gal Costa interpretando Brasil, de Cazuza, foi acertada na minha opinião, considerado o  ambiente em que se passa a obra.  Agora esperar a estreia e conferir.

P.S. Na nova versão a Heleninha será interpretada por Paola Oliveira. Comentei com minha mulher que não vejo na atriz, ao menos antes de vê-la construindo o personagem, a cara da “Heleninha”, como via em Renata Sorrah. Aliás, considero que uma das tarefas mais difíceis para qualquer artista é interpretar de forma convincente a imagem de um bêbado, uma pessoa alcoolizada para além da conta. Ressalvo, na área da comédia, a competência do impagável Tom Cavalcante, transmitindo, embriagado, um jogo de futebol.

 

Abraço e até mais.

 

sexta-feira, 28 de fevereiro de 2025

O HAVER - VINÍCIUS DE MORAES

Boa tarde amigos,



Na vasta antologia do poeta, compositor, músico e diplomata,  Vinícius de Moraes, encontra-se  um poema profundo, denominado O HAVER,  que teria sido alterado em parte pelo autor, algumas vezes, sem que ocorresse, contudo,  mudança na sua essência. Musicado pelo também compositor, Edu Lobo e bastante complexo, na  opinião dos mais variados críticos literários, especialistas em sua obra,  é fruto de uma reflexão  do "poetinha", (epíteto que lhe atribuiu um dia a saudosa cantora Elis Regina) a respeito da natureza humana e sua contingência (Resta essa voz íntima pedindo perdão por tudo. Perdoai. Eles não têm culpa de ter nascido).  Nele Vinícius, com rara maestria, vai construindo seu pensamento, por meio de  metáforas  (Resta esse coração queimando como um círio numa catedral em ruínas, essa tristeza diante do cotidiano ou essa súbita alegria ao ouvir na madrugada passos que se perdem sem memória....), pelas quais expressa os seus sentimentos acerca da vida e da morte, da tristeza e da alegria, da culpa,  das injustiças sociais, da pequenez do homem diante do universo (Resta essa imobilidade, essa economia de gestos, essa inércia cada vez maior diante do infinito),  da auto-comiseração e da  suposta inutilidade dos poetas e de suas poesias para mudar a realidade  (Resta essa vontade de chorar diante da beleza, essa cólera cega em face da injustiça e do mal-entendido, essa imensa piedade de si mesmo, essa imensa piedade de si e de sua inútil poesia e sua força inútil). E conclui o seu lamento, a sua catarse, à espera da  morte inevitável,  na figura de uma mulher e que chega,  como uma velha amante, agora sua mais  nova e definitiva companheira  (Resta esse diálogo cotidiano com a morte. Esse fascínio pelo momento a vir, quando emocionada ela virá me abrir a porta como uma velha amante. Sem saber que é a minha mais nova namorada).  Sem o prestígio de outras poesias e composições de Vinícius, como o Soneto da Fidelidade, Garota de Ipanema etc. etc., considero esse um dos mais relevantes poemas da segunda geração do modernismo brasileiro, ao qual pertencia o artista.

Grande abraço amigos!



 

 

sábado, 8 de fevereiro de 2025

ESFINCTERES E A VIDA QUE SEGUE

 

Bom dia amigos,


Cá eu dando tratos a bola, o que não me é incomum, acabei por imaginar um comparativo entre a anatomia do ser humano e a sua vida, que segue sempre em frente, apesar dos pesares. Explico: Quando o Criador esboçou a anatomia do corpo do homem e da mulher,  não esqueceu de enchê-la de  cavidades e de ..... esfíncteres!   Isso mesmo. Esfincter é o nome genérico dado aos músculos circulares que fecham as cavidades a que correspondem. Temos vários: esfíncter da bexiga, da boca, da vagina, do ânus, do esôfago. Em suma, tudo que ingerimos, que entra pela boca, deve seguir o seu destino pelos órgãos que integram o sistema digestivo. E os alimentos,  transportados e transformados em vitaminas, proteínas, minerais, carboidratos, etc., vão seguindo o seu rumo até que as sobras inaproveitáveis sejam expelidas. O perfeito desempenho das esfíncteres garantem o funcionamento natural dos nossos órgãos no exercício de suas funções. Aqui nada do tal  “junto e misturado”.  Não há, ou não deve haver nesse processo, retorno.   Assim também ocorre com a nossa existência. Não podemos viver ou nos prender ao passado. Ele já não existe. Um enorme esfíncter chamado “tempo” se encarrega de fechar  cada ciclo, obrigando-nos a viver sempre e apenas o presente na perspectiva de um futuro ignorado. A lógica da anatomia humana e dos processos do sistema digestivo vale igualmente para a vida. Bora, então, meus amigos, vivenciar com intensidade o momento presente, seja de festa ou de luto. E em seguida, fechar o ciclo. Do passado nos restam apenas as lembranças e as experiências. Do futuro, sempre hipotético, precisamos no presente de  bons e nobres projetos,  na mira dos quais encontramos, a cada dia,  razão ou objetivo para caminhar na trajetória incerta dessa vida terrena e contingente.

Forte abraço.

 

P.S. (1) A imagem acima, de parte do corpo humano, simula uma esfincter do estômago.