sexta-feira, 18 de julho de 2014

PELÉ ETERNO - UM DOCUMENTÁRIO PRA VALER

Boa tarde amigos,


Edson Arantes do Nascimento é seu  nome de batismo. Pelé, o epíteto pelo qual se tornou conhecido no mundo inteiro, num tempo em que as comunicações ainda se revelavam difíceis e precárias. Considerado o atleta do século, o jogador foi objeto de muitos estudos e vários documentários.  Criado e dirigido pelo cineasta Anibal Massaine Neto, com roteiro de José Roberto Torero e colaboração do saudoso jornalista Armando NogueiraPelé Eterno, é sem dúvida um dos melhores filmes que já se produziu sobre a vida e a carreira daquele que se tornou um mito, muito além do esporte que o revelou para o mundo. Foram 5 anos de extensa pesquisa e separação de toda a documentação que compõe o longa de 125 minutos, concebido e realizado com um orçamento de seis milhões de reais, em 2.004. São entrevistas feitas com familiares, amigos, ex-jogadores, jornalistas, especialistas e celebridades, dentre as quais,  o ex-técnico da seleção argentina, Cesar Menotti. E além disso, passagens e fatos pitorescos narrados por seus companheiros e pelo próprio ídolo.  E o mais importante: cerca de 400 gols dos 1.284 que o atleta fez durante sua prodigiosa carreira, envolvendo todos os campeonatos que disputou (regionais, nacionais, internacionais, mundiais e de quatro Copas do Mundo). Gols de todos os tipos, jogadas de gênio, dribles, gols com os dois pés (era ambidestro), de cabeça, de cobrança de falta, de pênalti, assim como as magníficas tabelas e as assistências que fazia para que seus companheiros de equipe pudessem concluir à meta. Curiosamente, aquele que foi considerado o gol mais bonito de sua carreira não foi documentado. Nenhum fotógrafo, nenhuma câmera de televisão esteve presente no acanhado estádio da Rua Javari, em São Paulo, no qual jogavam, pelo campeonato paulista, Santos e Juventus, para eternizar a sua mais genial jogada, que no longa é ilustrado com uma simulação de bonecos. Feliz foi o saudoso poeta Carlos Drumond de Andrade, ao sintetizar a diferença entre os gols de Pelé e outros de autoria alheia: “Difícil não é fazer mil gols como Pelé. Difícil é fazer um gol como Pelé”. O documentário em grande parte também registra para a história a ascensão do  Santos Futebol Clube das décadas de 60 e 70, a melhor equipe do Brasil, e suas esquadras maravilhosas,com Clodoaldo, Coutinho, Pepe, Zito, Formiga, e outros craques inesquecíveis. O Santos bicampeão da Libertadores e de Mundial de Clubes. O Santos,  oito vezes campeão paulista em 10 anos. Para quem, como eu, conheceu parte da obra de  Pelé, mas muito, muito menos do que se imagina, foi obrigatório ver o documentário com que um amigo me presenteou um dia do ano de 2.009. Um documentário que eu só vi agora, com calma, com a solidão necessária para ver, entender e sentir. E vibrar como nunca. Para os jovens que nunca viram Pelé jogar, é também obrigatório. Para todo brasileiro, qualquer que seja sua profissão ou vocação, mesmo para aqueles que não gostam de futebol, é também impositivo conhecer, em nome da história ou antologia deste país, o desempenho desse craque que encantou plateias do mundo inteiro, que se tornou conhecido em cada pedacinho do planeta, mais que o carnaval, que o samba, que o próprio Brasil. Um ídolo admirado por crianças, jovens, adultos e velhos. Um jogador negro que venceu todos os preconceitos e desafiou os limites; que mostrou categoria em todos os fundamentos do futebol; que aprendeu a vencer e a se livrar de quem quer que buscasse conter os seus avanços, os seus ataques, as suas mirabolantes jogadas, saltando ou se desvencilhando como um acrobata e levando consigo, sempre, colada ao pé, a bola, a sua eterna e obediente paixão. Pelé que injustamente expulso em partida fora do país, teve que voltar logo após, por imposição de toda a torcida que pagara para ver o seu espetáculo em campo, a despeito da partida e da rivalidade em si. Pelé que foi enaltecido pelos humildes e poderosos; que recebeu o reconhecimento e titulo de nobreza até da Rainha da Inglaterra. Pelé, cuja arte foi capaz de parar uma guerra e outros fatos impressionantes. Um documentário para ver, sem dúvida, nenhuma. Para admirar ainda mais e compreender a importância do atleta para a sua raça, para a sua família, para o futebol e o esporte em geral, e especialmente, para o nosso país, que a ele deve muito mais do que se imagina. E um documentário para ter, guardar e presentear os amigos e até, por generosidade, porque não, os inimigos. Em nome da arte. E da memória.

Até mais amigos,

P.S. (1) Em 21 (vinte e anos) de carreira, Pelé marcou 1.284 gols, em 1.375 jogos disputados. Foram 59 campeonatos e quatro Copas do Mundo (1.958, 1.962, 1.966 e 1.970), tendo sido tricampeão mundial (58 na Suécia, 62 no Chile e 70 no México). Foi durante dez anos consecutivos o artilheiro do campeonato paulista de futebol.

 P.S. (2) Em 25 de março de 1.958, antes da Copa do Mundo na Suécia, em que o Brasil conquistaria seu primeiro título, o jornalista, escritor e dramaturgo, Nelson Rodrigues, publicou sua primeira crônica sobre aquele menino de 17 anos que tinha encantado o Maracanã, num jogo com o América carioca, pelo Rio-São Paulo. Resultado Santos 5, América 3.  Veja os seguintes trechos dessa crônica:Depois do jogo América x Santos, seria uma crime não fazer de Pelé o meu personagem da semana. Grande figura, que o meu confrade Albert Laurence chama de “o Domingos da Guia do ataque”. Examino a ficha de Pelé e tomo um susto: — dezessete anos! Há certas idades que são aberrantes, inverossímeis. Uma delas é a de Pelé. Eu, com mais de quarenta, custo a crer que alguém possa ter dezessete anos, jamais. Pois bem: — verdadeiro garoto, o meu personagem anda em campo com uma dessas autoridades irresistíveis e fatais. Dir-se-ia um rei, não sei se Lear, se imperador Jones, se etíope. Racionalmente perfeito, do seu peito parecem pender mantos invisíveis. Em suma: — Ponham-no em qualquer rancho e sua majestade dinástica há de ofuscar toda a corte em derredor.”.  E ao aludir à auto-confiança que marcou também o atleta: “O que nós chamamos de realeza é, acima de todo, um estado de alma. E Pelé leva sobre os demais jogadores uma vantagem considerável: — a de se sentir rei, da cabeça aos pés. Quando ele apanha a bola e dribla um adversário, é como quem enxota, quem escorraça um plebeu ignaro e piolhento. E o meu personagem tem uma tal sensação de superioridade que não faz cerimônias. Já lhe perguntaram: — “Quem é o maior meia do mundo?”. Ele respondeu, com a ênfase das certezas eternas: — “Eu”. Insistiram: — “Qual é o maior ponta do mundo?”. E Pelé: — “Eu”. Em outro qualquer, esse desplante faria rir ou sorrir. Mas o fabuloso craque põe no que diz uma tal carga de convicção, que ninguém reage e todos passam a admitir que ele seja, realmente, o maior de todas as posições. Nas pontas, nas meias e no centro, há de ser o mesmo, isto é, o incomparável Pelé.”  Finalmente, ao falar sobre mais um gol sensacional do atleta e ao exercer o seu vaticínio sobre o que aconteceria na Suécia alguns meses depois: “Ora, para fazer um gol assim não basta apenas o simples e puro futebol. É preciso algo mais, ou seja, essa plenitude de confiança, certeza, de otimismo, que faz de Pelé o craque imbatível. Quero crer que a sua maior virtude é, justamente, a imodéstia absoluta. Põe-se por cima de tudo e de todos. E acaba intimidando a própria bola, que vem aos seus pés com uma lambida docilidade de cadelinha. Hoje, até uma cambaxirra sabe que Pelé é imprescindível em qualquer escrete. Na Suécia, ele não tremerá de ninguém. Há de olhar os húngaros, os ingleses, os russos de alto a baixo. Não se inferiorizará diante de ninguém. E é dessa atitude viril e mesmo insolente que precisamos. Sim, amigos: — aposto minha cabeça como Pelé vai achar todos os nossos adversários uns pernas-de-pau.”

P.S. (3) A insistência da imprensa mundial, especialmente da argentina, de discutir quem foi o melhor jogador entre Pelé e Maradona é absolutamente irritante. São dois grandes jogadores, mas que viveram épocas diferentes, em tempos diferentes, quando o futebol tinha regras e concepções igualmente diversas. Além disso, Pelé não foi simplesmente um jogador de futebol. Pelé é um mito para além do futebol. Pelé, com sua arte e a sua notoriedade, promoveu a revisão de conceitos,  quebrou tabus e alavancou mudanças de valores sociais e morais. Daí a irrelevância e a inutilidade idiota dessa discussão, que absolutamente não leva a nada, nem faz jus aos atletas que merecem respeito pela história que construíram nas respectivas carreiras. Guardadas, é claro e sempre, as devidas e necessárias proporções.




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