Amigos,
Foto oficial da equipe do Guarani Futebol Clube tirada no
jogo de ontem. Imagem emprestada de globoesporte.glo
bo.com.
|
O ex-goleiro e treinador, Leão, disse um dia que o
pior medo de uma equipe não era o medo de perder, mas o medo de ganhar. Junto a esse
pensamento, outro do saudoso jornalista e comentarista esportivo, Armando Nogueira, que de certa feita, ao falar sobre uma dessas
formações medíocres do Botafogo do Rio
de Janeiro, time pelo qual torcia desde pequeno, desabafou: - O problema é que esse time não tem alma.
Bem, fui ontem ressabiado para o Estádio
Brinco de Ouro da Princesa. Bugrino, desde menino, me acostumei, tanto com as vitórias, quanto com as derrotas,
embora estas tenham sido a tônica do Guarani
das últimas décadas, uma das equipes, senão a equipe que mais experimentou descensos
nos campeonatos que disputou nos últimos anos. Resta sempre o consolo de falar do
Bugre de outrora. Daquela equipe campeã brasileira, única do interior do Brasil,
até hoje, como se mandou escrever, em letras garrafais, em cima do Tobogã do Brinco, e que alguns amigos pontepretanos acham cafona, certamente por despeito, para relembrar de um passado de
glória que o torcedor das gerações mais novas jamais testemunhou. Mas se é
verdade que é no sofrimento, no revés, na desgraça, que as paixões mais se
intensificam, certo é que esse ditado tem tudo a ver com a nova torcida
bugrina. Nos anos 60, 70, o time do Guarani
sempre merecia destaque, com ou sem a conquista de títulos. Mas a torcida
não comparecia aos estádios com regularidade e em número compatível com a qualidade da equipe e do espetáculo. Reclamava-se de sua suposta indiferença,
coisa que na época era sinônimo de clube de elite, não de massa, o que
também se dizia do São Paulo e do Fluminense do Rio. Lembro-me que o
comentarista Juca Kfouri ,
destacado por um órgão de imprensa para cobrir a final entre Palmeiras e Guarani
no Brinco de Ouro em 1.978, escreveu de madrugada, para sua coluna, de um hotel em que se
hospedara na cidade, que era incrível o silêncio
que se sentia nas ruas, na noite da
conquista do título inédito e importante. Os bugrinos teriam preferido
comemorar a láurea no Tênis Clube de Campinas ou em outros locais mais elitizados da
cidade. Os tempos mudaram, por certo. Voltando ao presente, fui ao estádio relutante, mas convicto de
que era meu dever como bugrino ir lá e acreditar que a equipe seria capaz de reverter
um resultado totalmente adverso na fase do mata-mata. Uma equipe que há uma semana, simplesmente não entrou em campo na longínqua Arapiraca, no
Estado das Alagoas para jogar contra o ASA, apenas o quarto classificado da outra chave.
E que tomou três gols inacreditáveis, numa
defesa que tinha feito um campeonato até então de muita regularidade e
segurança. O que aconteceu? Coisas dos Deuses dos Estádios como diria um antigo
locutor campineiro. Não era dia. Não era ano. Não era a vez. Tudo isso se
misturava no pensamento durante a semana. E as estatísticas todas fatídicas: o Guarani não fez diferença de dois gols
em praticamente nenhum jogo desse campeonato. As exceções foram 2 em 18
rodadas. Tinha mais. O treinador se especializara em fazer grandes campanhas
na série C, e perder o acesso no mata-a-mata. Isso aconteceu nos dois anos anteriores.
Com toda essa carga contrária, teve ainda um amigo bugrino que insistia em
suspeitar do goleiro ou de jogador da defesa, que teria sido “comprado” no jogo
de ida, como supostamente acontecera
também em 1.982, na semifinal do Brasileiro, na derrota para o Flamengo. O
nosso goleiro, o carioca Wendel,
tinha tomado três gols "suspeitos", em noite pouco inspirada, em que o Brinco de Ouro recebia mais de 52.000 torcedores, o seu recorde de público
até hoje. O Fla, porém, era aquele
timaço de Zico, Junior e Cia., capaz de reverter qualquer resultado negativo e que
foi campeão brasileiro naquele ano, com todos os méritos. Bem, vou, não vou. Fui. Animei-me com as
notícias de que até a véspera mais de 10.000 ingressos tinham sido vendidos. A
torcida acreditava. Estaria ao lado do time. E que alguns dos heróis do
título brasileiro de 1.978, foram ao Brinco, para falar aos jovens atletas da necessidade de confiança e dedicação, para uma
perspectiva de sucesso e superação. Careca,
Zenon, Renato Pé Murcho e Bozó teriam ilustrado a mensagem com histórias da superação do Guarani
de 1.978.
Capa da revista de esportes PLACAR, edição
de agosto de 1.978, noticiando a conquista-
do título brasileiro pelo Bugre campineiro.
Imagem emprestada de imortaisdofutebol.
com.
|
Uma equipe do interior de São Paulo que tinha sido ridicularizada pela
imprensa gaúcha, um dia antes de ter metido um 3 a 0 inesquecível sobre o temível Internacional de Porto Alegre de Falcão, Batista
e outros craques, em pleno Beira Rio. Que nada obstante, ter
sofrido uma goleada implacável de 5 a 0, imposta pelo Remo de Belém do Pará, em tarde inspirada de um tal jogador Bira, que não iria fazer história relevante no futebol, foi capaz de superar tudo com vontade,
qualidade e raça. Ao chegar no estádio senti a força da torcida presente. Firme, barulhenta, alegre, transmitia otimismo
e confiança na onda da ola que se seguia, envolvendo todos e cada um dos presentes. Busquei uma cadeira vaga na lotada
vitalícia. Havia uma ao lado de um torcedor ilustre: Arthur Antunes
Coimbra Junior, filho de ninguém mais, ninguém menos, do que o lendário
jogador Zico. Junior torce pelo Bugre desde
1.986, quando o alviverde desclassificou
o Vasco da Gama e foi para a final
com o São Paulo, perdendo o título
nas penalidades máximas. Quando a equipe surgiu em campo aplaudida de pé, os jogadores devem ter sentido toda a energia
que exalava das arquibancadas. O jogo começou a mil. Nesse exato momento não
sei por que não tive dúvidas: O Guarani iria
alcançar o seu objetivo. Tiraria a diferença e selaria o seu destino de acesso
à série B do Campeonato Brasileiro. O
time vibrava. Sem nenhuma exceção. Havia entrega absoluta dos atletas em campo.
Eu e meu vizinho no setor de vita
lícias do Brinco de Ouro, o torce
dor ilustre, Arthur Antunes Co-
imbra Junior, filho de Zico, em
imagem do meu celular.
|
A cada jogada de recuperação de bola, cada metida para a lateral ou "limpada" de área era
acompanhada de uma ovação da plateia. E quando a bola estava nos pés do adversário eram apupos e ensurdecedoras vaias. O trio de arbitragem sentia o peso do público. Pelo menos um cartão amarelo foi mostrado para jogador do Asa, por
imposição daquela ruidosa platéia. Aí veio o gol. Fuma, o grande Fumagalli,
o herói bugrino, levanta a bola na cabeça de Leandro Amaro, que fulmina para as redes, sem chances para o
goleiro. 1 a 0. A torcida explode no
estádio, comemorando a abertura do placar e o caminho para a vitória e a classificação. A equipe se
empolga. E ataca sem medo ou temor. Acaba o primeiro tempo, não sem antes
sofrermos duas vezes o sufoco de chances perdidas pelo adversário. Fazia parte
da estratégia do jogo. Que a sorte estivesse conosco, pois transpiração, ousadia e confiança não faltavam. O segundo tempo começa a todo vapor. Vem o segundo gol da forma mais
improvável. O goleiro, ao cobrar um tiro de meta mete a bola contra a perna do centroavante Eliandro. E a pelota, com o choque, segue caprichosamente de mansinho para dentro do gol. 2 a 0 e a classificação encaminhada. Eram apenas 8 minutos do segundo tempo. O jogo
poderia acabar ali. Mas restavam 37 longos minutos, uma eternidade no futebol.
Pressão do adversário que, aquela altura não tinha nada a perder. O time faz
menção de recuar, o que é natural. Mas fica firme na marcação, sufocando o
adversário. Cada atleta se desdobra ao máximo. São bolas disputadas no alto e
no chão. Muitas divididas. Aí aparece um jogador de entrega de corpo e alma e que fez um
campeonato irrepreensível: O volante Auremir
nas suas cortadas, na sua velocidade, no seu empenho, era o símbolo do time em campo.
A dupla de zaga, Leandro Amaro e Ferreira,
soberba, representando a melhor defesa do campeonato e que veio junto e entrosada, batizada no acesso do Mirassol para a divisão de elite do Paulista. Uma dupla competente que defende com firmeza e faz gols.
Os laterais Lenon e Gilton que
auxiliam na defesa e frequentemente sobem para o ataque muito bem. E Wesley, um 7, que inferniza a defesa
adversária, com seu jeito moleque e a sua velocidade incrível. No meio campo, dos pés do sempre lúcido Fumagalli se repetem as tabelas com Renatinho e Pipico, este um dos mais sérios e regulares jogadores dessa equipe e
que merece muito destaque pela sua experiência e dedicação. Vários foram os contra-ataques que o Bugre armou sobre o desespero do Asa. Num deles, Eliandro, vocacionado ou iluminado pelo destino, faria o terceiro
gol, o golpe de misericórdia, aos 27 minutos, para nova explosão dos torcedores.
Ganhando dos zagueiros no corpo, vê o goleiro saindo e de cabeça, o encobre, mandando a bola para as redes. Acabou! Mais alguns minutos e o destino estaria selado. O
Bugre, depois de longos e penosos 4 anos de série C, garantiria o acesso à segundona
do Brasileiro. Um acesso que teve sabor de alívio e de conquista, com superação.
O técnico Marcelo Chamusca que levou o Guarani de volta
à série B do Campeonato Brasileiro. Imagem emprestada-
de www.guaranifc.com.br.
|
Superação também para o técnico Marcelo Chamusca que com o acesso encerra a maldição
de perder no mata-a-mata. O placar eletrônico adverte para que a torcida não
invada o campo, temendo por punição ao clube. Mas o que se viu foi um final com
uma torcida disciplinada. Sem deixar o estádio e ao som do hino do clube e dos fogos de artifício
que a Diretoria mandou soltar depois do jogo, aplaudia e gritava o nome de cada
jogador que dava a volta olímpica. Os aplausos também foram para o técnico Marcelo Chamusca que tirou de vez a "nhaca" que rondava a sua carreira, valorizada daqui para a frente, por certo.
Jogadores festejam no final da -
partida junto com a torcida. -
Festa e volta olímpica como-
se fosse um título. Imagem do
meu sobrinho Silvano Bressan.
|
Aqui os nomes dos jogadores que estarão na história de um Guarani vencedor: Leandro, Lenon, Leandro Amaro,
Ferreira, Auremir, Gilton, Wesley, Renatinho, Fumagalli, Eliandro e Pipico. E,
ainda, Denis Neves, Evandro, Marcinho, Zé Antonio, Diogo, Caio, Bruno, Roger,
Lucas Bahia, Pegorari e alguns outros do elenco montado para a disputa da série
C.
Até mais amigos.
P.S. (1) Com o tobogã ainda interditado pelo Corpo de Bombeiros, o Estádio Brinco de Ouro recebeu um público de 12.713, o maior do ano na cidade de Campinas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário