domingo, 12 de julho de 2020

CONTO - SAUDADES DA INFÂNCIA. DO JATOBÁ NÃO.



Boa tarde amigos,


Jatobazeira (pé de jatobá)  na área verde de minha casa em
Valinhos, com os frutos despontando neste mês de julho.
Imagem de meu celular.
Quem não tem saudades da infância e sua magia? O poeta Casemiro de Abreu a ela se refere aduzindo que: “são belos os dias, de despontar da existência, respira a alma inocência, como perfumes a flor, o mar é lago sereno, o céu um manto azulado, o mundo um sonho dourado, a vida um hino d’amor.”[1]. Fase encantada da nossa existência os meus seis primeiros anos de vida os passei na minha cidade natal, Pirambóia, hoje Distrito de Anhembi, ao pé da serra de Botucatu, com direito a tudo que havia de concreto  e peculiar ali: apenas o acesso aos três primeiros anos do ensino fundamental, com uma única sala e professora para dar conta de três turmas aglutinadas, cada fileira composta de alunos de uma série do curso, até o 3º. A partir do 4ª. série de “grupo escolar” (nomenclatura dada às quatro primeiras séries do fundamental naquela época), a criança precisava deixar a cidade e se deslocar para outra, maior, que permitisse a continuidade dos estudos. Era o ano de 1.958. Minha irmã mais velha, já cursava o Ginasial em colégio interno de freiras situado na cidade de Laranjal Paulista. Eu cursava a primeira série e a minha outra irmã a 3ª. Tínhamos ainda dois irmãozinhos que não tinham idade para ingressar nos estudos.  Por isso mesmo, o velho Sr. Nagib e sua esposa, Dna. Latifa, no ano seguinte, deliberaram mudar-se para uma cidade em que todos os filhos pudessem receber  instrução até o nível universitário, sem que, para tal tivessem que deixar o lar paterno.  Não éramos seis, éramos sete, o casal e cinco filhos. Foi quando nos mudamos para Campinas, no velho bairro do Taquaral, onde papai conseguiu comprar um bar situado na rua Paula Bueno e alugar uma casa na rua Conselheiro Antonio Prado. Mas, voltando à primeira infância nela vivi anos incríveis, participando ativamente de tudo quanto estava disponível no pequenino torrão natal (e não era muita coisa), cujo estilo de vida era predominantemente rural e onde se podia conviver com galinhas e porcos e tomar leite direto da fornecedora, a generosa vaca, que nada cobrava por isso. Arriscava-se, na moita, a "emprestar," sem que o dono o soubesse, por algum tempinho, um cavalo, a modalidade mais usada no transporte, tanto nos sítios, quanto nas quatro ruas em que se circunscrevia a zona urbana.  Não tínhamos televisão, nem geladeira e muito menos automóvel, artigo de luxo reservado unicamente aos milionários. 
celo Pimentel, Imagem de um jatobá aberto mostrando sua    -
polpa espessa.
Mas tínhamos conforto, pois a casa era grande e se situava nos fundos do estabelecimento comercial de meu pai, um armazém grande com todo tipo de mercadoria (secos, molhados, armarinhos, tecidos, etc.),  espécie de mini mercado que vendia fiado por ano aos fregueses, até que se verificasse a colheita e desde que ela não malograsse. A maioria das casas pertencia a grupos da mesma família, quase todos parentes de meu pai, ou de minha mãe. Eram primos de primeiro e segundo graus, tios, avós, tios-avós etc. Umas das tias de meu pai, tinha uma bela fazenda na região e, de vez em quando, sua única filha mulher, solteirona e carola, nos levava junto para recreio, enquanto ela cuidava dos negócios com o capataz. Numa dessas vezes levou a mim, de cinco anos e meu irmão, Antonio, que tinha três. Além de algum gado e de pequenas culturas, predominava o cultivo de uma planta chamada jatobazeira,  que dava o tal jatobá, uma fruta estranha com uma casca grossa de cor marrom escuro e que, aberta, mostrava uma polpa verde,  que parecia feita de farinha muito espessa. Você colocava aquilo na boca e aquela massa estranha se derretia e engrossava em contato com a saliva. Eta gosto ruim! Nos primeiros tempos a gente tolerava aquilo. Depois meu, era insuportável. Sei que a tal fruta passou a fazer parte da minha memória não só pelo gosto ruim, mas, sobretudo, pelo acontecido em uma das vezes que a tal prima do meu pai resolveu nos levar até a fazenda. Por volta das 14,00 horas, alegando que precisava tratar de negócios com o capataz, ela nos deixou debaixo de uma jatobazeira advertindo-nos que aguardássemos ali o seu regresso. Não discutimos.  Horas se passaram sem que nem sombra dela ou do capataz surgisse. Começamos a ficar com medo. Era inverno e os dias eram mais curtos. Consumimos não sei quantos jatobás enquanto esperávamos para driblar a apreensão e o medo que sentíamos. Será que fomos abandonados? Não sabíamos como sair dali. E agora? Acontecera alguma coisa com a prima? Quando começava a escurecer devagar e nós, abraçados, já esperávamos pelo pior, surge a prima e o capataz, para nosso alívio. Voltamos para casa e nunca mais quisemos visitar a fazenda, menos ainda na companhia dela. Na época nossa ingenuidade acreditava que os negócios de que foram tratar eram demorados e complexos. Hoje suponho que, embrenhados na mata, prima  e capataz foram fazer outra coisa. E nós ali servindo de álibi para ela, hein, safada?  Isso aconteceu a rigorosos 64 anos!!!!!!!! Minha memória, ainda muito boa para as coisas mais antigas (o que é, sabemos, preocupante), é capaz de reproduzir o acontecimento com detalhes. E com o gosto horroroso do jatobá. Hoje, porém, fomos à nossa casa de Valinhos, no Condomínio Chácara Flora. E minha mulher apontando para uma das árvores que temos na faixa obrigatória de área verde observou: - Você sabe que temos um pé de jatobá? E ele está carregado de frutos que ainda estão verdes, suponho. Olhei para cima e identifiquei muitos frutos nos galhos da árvore apontada. Sinistro!!! Puta que pariu! Essa praga tinha que me perseguir? Juro que ainda tenho náuseas ao sentir o gosto da baba que aquela polpa provoca em contato com a saliva, lembrando uma vaca ruminando e babando. E o cheiro?   Juro que  é de merda, tanto assim que, consultando fontes fidedignas, descobri que é conhecida como "fruta chulé".  Às vezes confesso sinceramente  que tenho saudades da aurora da minha vida, como bem dizia o Casemiro de Abreu, ao se referir à infância.  Mas do jatobá meu não tenho nem fodendo!


Até mais amigos.


Extraída do GOOGLE:

P.S. (1) O jatobá-verdadeiro, jatobazeiro ou apenas jatobá, é uma árvore da família das fabáceas. Espécie arbórea dominante na floresta estacional semidecidual  submontana (sacaram?). Seu fruto fica maduro entre os meses de julho a setembro, possui casca dura e em média duas sementes por fruto. No interior, a polpa é um pó verde amarelado com forte odor, que é comestível. A polpa é rica em ferro e é indicada para pessoas que apresentam alto grau de anemia. A casca também é aproveitada para chá;

P.S. (2) Fazendo justiça ao jatobá: o jatobá serve para cicatrizar feridas, tratar asma, blenorragia (popular gonorreia), cistite, cólicas, vermes, doenças respiratórias, feridas na boca ou no estômago, prisão de ventre, coqueluche, desinteria,  má digestão, fraqueza, problema de próstata, tosse e faringe. Que propriedades?;

P.S. (3) Não seria interessante testá-la para tratamento da covid-19 já que ela é boa para vários dos sintomas como tosse, doenças respiratórias etc. e tal?
  













[1] Meus Oito Anos.

segunda-feira, 6 de julho de 2020

UM LINDO DIA NA VIZINHANÇA - SHOW DE EMPATIA EM TEMPOS DE CORONAVÍRUS


Bom dia amigos,


À esquerda  Tom Hanks no papel de Fred Rogers em Um Lindo dia na Vizinhança. À direita, o próprio Fred.

O longa UM LINDO DIA NA VIZINHANÇA, tradução fiel e literal de seu título em inglês, A BEAUTIFUL DAY IN HE NEIGHBOURHOOD, não foi feito para emocionar em tempos de isolamento e de pandemia, de que não se cogitava quando ele foi  concebido pelos roteiristas Micah Fitzerman-Blue e Noah Harpter e rodado no set de filmagem em 2.019.  Mas sem essa intenção, o filme, que não cuida propriamente de realizar uma cinebiografia do apresentador, Fred Rogers, animador de programa infantil de grande sucesso nos anos 60 nos Estados Unidos, investido em  papel secundário (?), na pele de Tom Hanks   consegue transmitir mensagem de amor, bondade,  humildade, humanidade e respeito nesses tempos de incerteza e desesperança, quando mais se torna visível e acentuado o abismo social entre pobres, ricos e miseráveis num mundo globalizado. Na ficção, Lloyd Vogel (Mattheus Rhys), jornalista investigativo cético, amargo e rancoroso,  com sérios problemas de relacionamento com o velho pai, Jerry (Chris Cooper) e com a mulher, Andrea (Susan Kelech), é escalado pelo jornal em que trabalha para traçar um perfil do apresentador, Fred Rogers (Tom Hanks), pauta essa que ele abomina, mas é obrigado a aceitar. Irritado por não acreditar na bondade do homem e do personagem, começa a reportagem com o firme propósito de desmascarar, tanto um, quanto o outro. À espera de entrevistas, porém, é obrigado a assistir a gravações do programa, tomando conhecimento da dedicação de Fred que, pessoalmente, dá voz a vários bonecos infantis e às canções que conferem ao programa todo o seu conteúdo mágico e lúdico, que encantou durante décadas a  crianças e adultos.  Observa, ainda,  como Fred se relaciona de forma carinhosa, com toda a equipe de produção e a sua atenção para com  os adultos e crianças que o procuram para autógrafos ou apenas para contar alguma história de vida.  Durante as entrevistas Fred manifesta interesse  pela vida pessoal do jornalista, que  se irrita com o que considera uma invasão à sua privacidade e que, por isso, chega a desistir do trabalho. Mas aos poucos, porém, é convencido a continuar e vai refletindo, paulatinamente,  sobre as lições de vida que o apresentador vai lhe transmitindo, com cuidado e sinceridade, como que adivinhando os seus dramas pessoais, que ele teima em não revelar.  O carisma e talento de Tom Hanks, no papel de um também carismático apresentador de programa infantil do século passado nos Estados Unidos, garantem a diferença que o espectador percebe entre esse e outros tantos filmes do gênero. Só para sessão da tarde na Globo em época de férias? Não, não. Meu neto, Rafael, de 8 anos, adorou. E mamãe e papai, de mais de 40 cada um, também. Eu e minha “patroa” com mais de 60 também. São quase duas horas de um “oásis”  regado a pipoca ou a uma taça de vinho durante a quarentena para fugir especialmente das notícias ruins que inundam os programas de jornalismo ou de entretenimento (????) de agora. Experimente!

Até mais amigos.