Boa noite amigos,
Não, não era propriamente uma voz como da menina Bethania, aos 17 anos, entoando firme e forte a mensagem da ave do nordeste, Carcará, no espetáculo Opinião dos anos 60. Não, a jovem Bethania cantava sim grave, muito mais grave do que hoje, aos 60 e tantos anos, quando madura, se transformou num ícone versátil da musica popular brasileira. Quando ouvi aquela voz cheia, grave, numa dicção absolutamente perfeita, diferente de tudo que já tinha ouvido, em 1.999, na novela Andando nas Nuvens da Rede Globo, cantando uma música porreta, cujos versos diziam assim: Minha garganta estranha quando não te vejo/vem um desejo doido de gritar/minha garganta arranha as tintas e os azulejos/do teu quarto, da cozinha, da sala de estar..../, confesso que fiquei curioso e encantado. Há muito que nada assim tão novo, tão peculiar, tão autêntico tinha surgido, desde os tempos de Gal Costa, de Elis, de Rita Lee e da própria Maria Bethânia. As cantoras, com pequenas diferenças de sotaques ou falsetes, se repetiam. Aquela mineira de Juiz de Fora, desconhecida da grande mídia e do grande público chamava a atenção, ainda porque a sua música integrava uma trilha sonora de novela global, o que praticamente garantia – e ainda garante, como sempre – divulgação e sucesso. Mas não era só oportunidade, surgia assim para todos nós, uma grande cantora e compositora. Plena como sua voz, forte de personalidade, criativa, corajosa e inteligente. De Garganta, primeiro sucesso, outros se repetiram e a artista, com um público fiel e cativo, se tornava uma das mais requisitadas estrelas do país, condição que ostenta hoje indiscutivelmente. Com méritos? Claro,sem dúvida. Mérito reconhecido por grandes intelectuais e pelo público comum. Por brasileiros e estrangeiros famosos, que gravaram com ela, dentre os quais, Alejandro Sans e Tony Bennet. Mas esses sucessos identificaram a musa como a cantora das baladas românticas e de algumas versões. Os técnicos e os amantes da boa música, os fãs de todas as classes e a própria Ana, porém, exigiam mais. Quatro anos depois do último trabalho e seis CDs depois, Ana Carolina está aí com o seu mais novo CD na praça. Batizado apenas de “#AC” é um disco de qualidade, que reúne nas 12 faixas apenas músicas inéditas, incluindo vários ritmos, como sambas e tangos, todos de sua autoria, alguns em parceria, escolhidos num universo de 50 canções que a cantora compôs nos últimos anos. Relembrando os velhos tempos da MPB, década de 30 e 40, quando era comum compositores escreverem músicas para registrar o momento pessoal de suas intérpretes e, outros, em seguida, escrevendo novas músicas em resposta àquela provocação (aconteceu muito com o casal Dalva de Oliveira/Herivelto Martins, por exemplo), Ana Carolina se aventura no gênero, escrevendo e gravando a réplica Resposta da Rita (5ª. faixa do CD), na qual responde a Chico Buarque e suas queixas ao comportamento da mulher durante a separação, registradas no antológico samba Rita. Lembram-se: / A Rita levou meu sorriso/ No sorriso dela o meu assunto/ Levou junto com ela o que me é de direito/ Arrancou-me do peito e tem mais/ levou seu retrato, seu trapo, seu prato, que papel/uma imagem de São Francisco e um bom disco de Noel/.... E Ana, respondendo: /Não levei o seu sorriso/porque sempre tive o meu/Se você não tem assunto, a culpada não sou eu....” O próprio Chico, aprova, é claro, pois participa da segunda parte da faixa cantando, simultaneamente com a cantora, a sua Rita original, enquanto ela reproduz a sua réplica. O resultado: delicado e muito bom. Uma novidade, claro, para a nova geração, que haverá de apreciar eventualmente, a exumação do gênero. A chamada música de trabalho, sem dúvida, é Combustível (faixa n. 4), porque está na novela da moda, Amor à Vida, da Rede Globo, e no CD da trilha sonora nacional da teledramaturgia. Realmente, uma bela música, independente disso. Mas tem especialmente para meu gosto, Luz Acesa (faixa n. 11), encantadora e que também esteve recentemente em outra novela global: Flor do Caribe. E ainda a participação especial da cantora Chiara Civello, dividindo Um Sueno Bajo El Agua. Pelo Iphone (faixa n. 6), é um samba jeito moderno, em tempos de tablet, internet, twitter, redes sociais e outras novidades tecnológicas, de homenagear o nosso primeiro samba gravado – Pelo Telefone – atribuída a Donga, nos idos de 1.916. As demais faixas trazem letras peculiares e o recado ousado e debochado da cantora que tem como temas o amor, o desamor, o sexo sem tabus ou preconceito e a crítica à hipocrisia social. Um disco mais “pop” assevera Ana em entrevista dada logo após o lançamento. Pole Dance (faixa n. 1), Libido (faixa n. 3), Mais Forte e Bang Bang 2 (faixas ns. 7 e 8) e a poética Canção Para Ti (faixa n. 9), completam o CD, que leva ainda outra participação especial: a de Guinga em Leveza da Alma (última faixa). A participação do DJ Cia, dos músicos Alê, Mikael Mutli, e da própria Ana, nos arranjos e instrumentos, garantem o “groove” que se buscou como resultado. Em resumo: um disco repleto de composições mixadas, dançantes e pop, como considera a cantora. E de muito boa qualidade.
Até amanhã amigos.
P.S. (1) Questionada sobre
o sétimo CD e a respeito do rompimento com o seu rótulo de cantora de
baladas, Ana observou: “Queria um pouco
isso. Fiquei conhecida e engessada por essa característica. Não é nem que não
goste, adoro cantar balada. E vou cantar assim a vida inteira. Mas queria
mostrar que podia fazer um disco de levada, de batida, de groove. E um disco
dançante, mais quente, mais abusado e descaradamente pop. Queria fazer com que
as pessoas associassem as canções e ficassem com elas na cabeça o tempo todo”;
P.S. (2) Ana Carolina se
confessa fanática pela Internet. Fica de 10 a 12 horas por dia navegando,
especialmente fazendo contatos em redes sociais. Tem grande número de
seguidores no Twitter, no Facebook e no Instgram. Para eternizar esse seu momento, marca o nome de
seu CD, com o sinal tipográfico da hoshtag (#);
P.S. (3) Para aqueles que, como eu, têm dificuldades com
essas modernidades da linguagem e símbolos virtuais, hoshtags são palavras chaves antecedidas do símbolo #, que designa o assunto o qual está se
discutindo em tempo real no Twitter,
e também foi adicionado ao Facebook
e Instgram. Os hoshtags viram hiperlinks
dentro da rede e indexáveis pelo mecanismo de busca, permitindo o contato com todos os participantes da discussão. O símbolo # conhecido como
cerquilha, no Brasil é chamado de “jogo
da velha”“ ou “lasanha” ou,
ainda, “tralha”; em Portugal como “jogo do galo” e nos Estados
Unidos como “hash” daí, hashtags. Os tags correspondem a palavras-chaves que se destacam nas monografias
e dissertações de mestrado. Sacaram? Bem, fiz o possível.
P.S. (4) A artista conquistou esse ano o Prêmio Contigo MPB FM de Música de 2.013, em duas categorias: como Melhor Cantora e Melhor
Música ("Combustível");
P.S. (5) Ana Carolina
é uma das recordistas de músicas integrantes de trilhas sonoras: Apesar da
curta carreira tem nada mais, nada menos, do que 22 canções temas dos mais
diversos personagens das dramaturgias. Supera, nessa marca, veteranos
consagrados como Fábio Junior. Dentre
as várias músicas destacam-se, além de Garganta
(Andando nas Nuvens), Tô Saindo (Vila Madalena), Ela é Bamba (Filhas da Mãe), Encostar na Tua (Celebridade), Vox Populi (Seus Olhos – SBT), Uma Louca Tempestade
(Senhora do Destino) e Nua (Como
Uma Onda);
P.S. (6) Os cinco artistas recordistas de músicas compondo
trilhas de personagens, incluindo novelas, casos especiais, minisséries, em
todos os canais ativos e também das extintas TV Manchete e TV Tupi, são nesta ordem:
Caetano Veloso, com 73; Maria Bethânia,
com 59; Gal Costa, com 49; Elis Regina, com 45 e empatados com 44, Rita Lee e
Milton Nascimento;
P.S. (7) A imagem da coluna de hoje é da capa do CD da
cantora. Para informações constantes da coluna foram consultados o blog da
própria cantora e o site PT.wikipédia.com.
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