Boa tarde amigos,
Domingo de um sol cativante de outono, mas sem o ardor dos
sóis de verão aqui no hemisfério sul.
Preso no apartamento e acordando tarde, depois do café é imperioso
descer para a área comum do prédio, de boas dimensões e bem arborizada.
Escolher aquele canto em que o sol, naquela hora, bate iluminado mandando pra
gente aquela energia incomparável com
qualquer outra. E a crença de que, quentinho sobre o corpo, além de sintetizar
a vitamina D, vai matar todas as bactérias e vírus que assolam a humanidade.
Dizem que é a grande vantagem dos países tropicais como o nosso. Sei lá se tem
comprovação científica, mas funciona psicologicamente como uma suposto antídoto
contra o medo de contrair o tal coronavírus. E dá-lhe praia nesse povo que vive
acotovelado em habitações coletivas minúsculas e nas imensas favelas espalhadas
pelo Brasil afora, hoje chamadas de comunidades, por eufemismo. Enquanto tomo
sol absolutamente sozinho (aqui no meu prédio ninguém teve coragem de aparecer
por aqui enquanto eu permaneci, pelo menos) dou tratos à bola. Agradeço ao sol,
a Deus, à Natureza que me deram a condição privilegiada de morar bem, ter uma
companheira, filha, genro, neto, amigos, alunos e ex-alunos, clientes e uma
aceitável saúde para os meus 68 anos de estrada, que foram árduos e
compensáveis pela experiência e pela tentativa de me deixar cada dia mais
solidário e tolerante comigo e com o ser humano em geral, cuja natureza,
estrutura biológica e mental, fraquezas, instintos e atos de nobreza e outros aspectos
constituíram e constituem parte considerável de minha curiosidade científica e
minha propensão pelo estudo da antropologia, filosofia, sociologia, psicologia e outras
humanidades . E não há como não pensar nas notícias que chovem pelas mídias
afora sobre a pandemia que se abate sobre o mundo, sem pedir licença, sem
passaporte, sem escolher ricos ou pobres, pretos, brancos, pardos ou amarelos, ou
qualquer forma de distinção em classes ou categorias. De tudo que ouvi até
agora e até que se encontre uma vacina que impeça esse vírus novo e atrevido de
infectar pessoas, todos, absolutamente todos nós seremos infectados um dia. Os
cientistas não ignoram isso. Claro que a grande maioria (cerca de 80% segundo
estimativas) terão sintomas leves ou não terão sintoma algum, o que um
percentual considerável. Dos 20% porém que terão sintomas moderados ou graves,
estima-se também que 5% necessite de utis estruturadas com respiradores que
possam sustentar a vida por respiração artificial, enquanto isso for possível
ou suficiente. Pois bem, se pegarmos um país como a Itália, duramente atingido
pelo vírus, com 60 milhões de habitantes e partirmos do princípio (para mim
indiscutível) que todos os cidadãos contrairão a virose mais cedo ou mais
tarde, teremos numa simples equação, 12 milhões de infectados
com sintomas moderados ou graves. Se 5% necessitarem de UTIS (estimativa que se
confirma a cada dia) são simplesmente 3 milhões de pessoas no país que tem a
maior riqueza em obras e monumentos tombados e o maior turismo do mundo. Que
sistema de saúde por mais organizado e moderno que seja seria capaz de atender
a essa população monstruosa ao mesmo tempo? Claro que nenhum, nem os dos países
mais ricos e menores em população como a Dinamarca e a Suécia. Por isso
que o apelo para as medidas de higiene intensas e o afastamento social com
ênfase no recolhimento domiciliar é fundamental se não quisermos ver nossos
entes queridos, amigos, familiares e nós mesmos (integrantes do
principal grupo de risco), morrer em
filas enormes nas portas dos atolados hospitais públicos e privados, sem que
haja qualquer possibilidade de socorro ou atendimento. A questão é, portanto,
fundamental como assinala o nosso Ministro da Saúde que em menos de dois meses
virou alvo preferido da mídia e da população brasileira, mesmo e também pelo
confronto que estabeleceu com o Presidente da República. Aliás, o nosso
Bolsonaro consegue coisas inéditas, ou seja, ser desautorizado até pelos seus correligionários militares,
incluindo o vice-Presidente da República, que deu sua posição pelo afastamento
social e pelas recomendações do Ministro da Saúde e dos Governadores, em rede
de televisão, garantindo que essa era a posição “oficial” do governo
brasileiro. Ignorado, censurado, o Presidente é alvo de críticas de todos os
lados, citando como o único líder mundial que a esta altura, ainda insiste em
proteger supostamente a economia, mandando o povo trabalhar e chamando a
pandemia de “gripezinha”. E impressionante a popularidade e credibilidade que
ganha esse para nós até então desconhecido Mandetta, com um carisma
impressionante, um discurso coerente e honesto e que hoje seria eleito para
qualquer cargo que eventualmente disputasse. Venceu a
minha meia hora de sol e ainda tentei falar com o porteiro. Quando abanei,
próximo da portaria, a minha mão, ele percebeu que eu queria dizer ou pedir
alguma coisa e gentilmente abriu a porta. Eu o cumprimentei e, a mais de dois
metros de distância, procurei matar a minha curiosidade com ele sobre coisas banais:
A família está bem? E o ônibus hoje estava cheio? Acredita que o Prefeito de
Americana suspendeu toda a circulação de ônibus urbanos aos domingos? E quem
tem que trabalhar como o senhor ou os profissionais de saúde? E a senhora do
11º andar tem saído com o cachorrinho para dar as voltas de praxe? Quem mais
não tem saído com o cachorro? Então está bem, bom dia pro senhor e cuide-se.
Sinta-se abraçado à distância OK? Subi com um pano cheio de álcool gel para
abrir a porta de entrada, chamar o elevador e descer no meu segundo andar. Abri
a porta e logo na entrada estava o meu chinelo de dentro. O de fora fica
acomodado bem próximo dali. Fui imediatamente lavar a mão olhando no relógio
pra ver se dava os 20 minutos mínimos apregoados. E a certeza de que nada disso
vai evitar que um dia eu pegue a “mardita”. A menos que eu fosse um ermitão isolado
numa montanha lá perto do fim do mundo longe de tudo e de todos. Mas, gente.
Vamos colaborar com a orientação dos cientistas. Espaçar, espaçar, diminuir a
curva ascendente e o pico da contaminação tão temida, que o sistema de saúde
não dará conta mesmo e teremos uma tragédia de proporções maiores do que as da
Itália e Espanha e muita gente vai morrer sem socorro. Somos 210 milhões de habitantes, a grande maioria sem condições de isolamento ou acesso aos itens de higiene. A não ser que você pense
que nem o Bolsonaro: afinal todo mundo vai morrer mesmo um dia, não, mas os
empregos têm que continuar! Que preciosidade.
Em criação de Mara Miguel, bolo temático
com desenhos de coronavírus. A criançada
canta, o aniversariante apaga a velinha e aí
todos comem e destroem o vírus do mal.
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Bom domingo.
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