domingo, 1 de setembro de 2013

TRAGÉDIA DE SÃO MATEUS E A DECLARAÇÃO EQUIVOCADA DO PREFEITO HADDAD

Boa noite amigos,


Pronunciando-se, em entrevista coletiva, sobre o grave e lamentável acidente verificado em obra que se realizava na zona leste de São Paulo, o Prefeito Fernando Haddad afirmou que se tratava de construção irregular, tanto assim que o responsável teria sido multado e a obra embargada pela Subprefeitura  de São Matheus. Ao tentar justificar, contudo, a razão pela qual a obra prosseguiu a despeito do embargo, disse que o descumprimento só poderia ser evitado com ordem judicial que permitisse ao Poder Público, inclusive, requisitar força policial. Assisti perplexo, para não dizer decepcionado, a tal entrevista e a afirmação profundamente equivocada. Ora, se a Administração Pública tem o poder de embargar extrajudicialmente qualquer construção irregular, como determinar a lacração de estabelecimento ou interditar atividades ilegais, porque dependeria do Poder Judiciário  para tornar efetiva a determinação? Quem quer que tenha recebido lições primárias de direito administrativo sabe que um dos poderes conferidos à Administração Pública é o poder de polícia-administrativa, que traz como corolário a autoexecutoriedade de seus atos. Essa prerrogativa é consequência direta do poder de polícia administrativa. O saudoso Professor Hely Lopes Meirelles, em alentada obra a respeito do assunto, enfatiza: “A auto-executoriedade, ou seja, a faculdade de a Administração decidir e executar diretamente sua decisão, por seus próprios meios, sem intervenção do Judiciário, é outro atributo do poder de polícia. Com efeito, no uso desse poder a Administração impõe diretamente as medidas ou sanções de polícias administrativas necessárias à contenção de atividade anti-social que ela visa a obstar. Nem seria possível condicionar os atos de polícia à aprovação prévia de qualquer outro órgão ou poder estranho à Administração. (....) O que o princípio da auto-executoriedade autoriza é a prática do ato de polícia administrativa pela própria Administração, independentemente de mandado judicial.” (Direito Municipal  Brasileiro, 18ª. edição, 2.008, São Paulo: Malheiros, p. 486-491). A jurisprudência, há muito, se pacificou nesse sentido, não reconhecendo interesse jurídico em pretensões manejadas pelos Poderes Públicos para obter ordem judicial, visando respaldar seus atos, desnecessariamente (cf. por obséquio, dentre outras, os decisões proferidas pelo Tribunal de Justiça de São Paulo:   Apelação Cível n. 0000989-53.2010.8.26.0358 da Comarca de Mirassol, Relator Desembargador Rubens Rihl, j. 20.6.2.012; Ac. N. 942.587.5/5-00, Presidente Prudente, Rel. Des. Leme de Campos, j. em 16.11.2.009; Ac. n. 336.128,4/8-00, Rel. Des. Ricardo Lewandowski, j. em 24.8.2.005; Ac. n. 949.069.5/2-00, Rel. Des. Leme de Campos, j. em 16.11.2.009). Consultando o rico currículo do Prefeito Haddad, ex-Ministro da Educação do governo Lula, verifica-se que além de Professor de Ciência Política pela USP, é também Bacharel em Direito pela mesma respeitável Universidade (cf. pt.wikipedia.org), o que torna imperdoável a afirmação desprovida de fundamento jurídico e lógico. O fato é que mais uma vez se positiva a manifesta incúria da máquina administrativa que se revela ineficiente para, a tempo e a hora, tornar efetivas, de ofício,  as próprias decisões (o embargo teria sido determinado em 25 de março deste ano) e, pois, para  evitar tragédias que sacrificam vidas humanas, sobretudo a de pessoas mais simples, como os operários da construção irregular que se levantava no terreno. E nem a responsabilidade civil de todos os envolvidos, inclusive e nomeadamente  a da Administração Pública, nem as indenizações que a Justiça vier  a fixar em favor de familiares, será capaz de aplacar a culpa de todos nós pela inércia na cobrança de condutas éticas e de providências  que não banalizem mais a vida neste país,  no caso, de pobres e indefesos operários da construção civil submetidos a toda espécie de riscos e sofrimentos para satisfazer, rapidamente, as necessidades de um mercado ávido pelo capital e a riqueza incondicionados.

Até amanhã amigos.

P.S. (1) A imagem da coluna de hoje foi emprestada de blogcancaonova.com.

O artigo desta coluna foi publicado no jornal Correio Popular de Campinas, edição de 04 de setembro de 2.013, caderno A- pág. 02.


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