segunda-feira, 30 de setembro de 2013

A ARTE DE GUILHERME COTEGIPE

Boa noite, amigos


Era ainda menino quando conheci Guilherme Amâncio Cotegipe. Aos 14 anos fui trabalhar como auxiliar no Cartório do 5º Ofício Judicial de Campinas, ainda ao tempo em que os Cartórios judiciais não eram oficializados, isto é, tal qual acontece hoje com os extrajudiciais (Tabelionatos, Registros Civil e de Imóveis etc.), objeto de delegação do Estado a particulares. Bons tempos aqueles. Sob a batuta de três extraordinários Escreventes (Adyr José Bannwart, Aluisio Antonio Marques e Geraldo de Carvalho Junior), e a supervisão do imprevisível e irascível dono do Cartório (o Tabelião e Escrivão, Dyonísio José dos Santos Filho), pertencíamos a um grupo de jovens auxiliares (além de nós dois, o João Baiano, o Sérgio Spricigo, o Odair Schaffer, o Buzim e o Cazarin).  Guilherme era também  aluno do badalado Culto À Ciência, um dos dois melhores colégios estaduais de Campinas, enquanto eu fazia meu curso ginasial, depois colegial, em outro estabelecimento de ensino público, recém criado, sem a mesma fama e prestígio, situado no bairro do Taquaral,  (o Colégio Estadual Barão de Ataliba Nogueira). Mas o assunto hoje é o Guilherme. Aluno brilhante, especialmente nas disciplinas da área de Humanas, Guilherme, depois de se formar em Jornalismo,  foi para São Paulo em 1.974,  onde trabalhou, como Revisor, na Folha de São Paulo,  na  Revista Isto É e  no Diário do Comércio. Em 1.987 segue  para Salvador, onde passa a residir e exercer a mesma profissão de Revisor no jornal A Tarde. Em 1.998,  deixa o trabalho de Revisor e retorna às origens, voltando a residir em Campinas, onde passa a abraçar as artes plásticas.  Autodidata, o interesse do artista é a cultura brasileira, especialmente, a cultura popular, manifestada em  danças,como o frevo e o samba, em festas folclóricas religiosas, como o Divino, a Congada, a Festa de Reis, e em desfiles regionais ou nacionais (Boi Bumbá, Maracatu, Carnaval).  Em 2.005, em entrevista para o Correio Popular, desabafou: “Não há um artista vivo preocupado em divulgar as manifestações culturais brasileiras, o lado festivo do povo”. Nesse mesmo ano, foi convidado a expor sua arte no Salon d’Art Nature Animaux de Paris, local que reúne trabalhos de designers e compositores brasileiros.  Guilherme afirma não se considerar propriamente um pintor, mas um desenhista, cuja autenticidade e diferencial está no jeito próprio e característico de riscar as figuras. O gênero? Bem ele não gosta muito de falar de gênero de sua arte.  Foi considerado, porém, “um pouco naif”, pela produtora Carmen E. Pousada,  isto é, um primitivista, gênero de pintura que não se  vincula a nenhuma escola ou tendência específica. Assinala também que muitos autores e artistas influenciaram  os seus temas, dentre eles, os baianos  Jorge Amado e Caetano Veloso.  Tímido, no bate-papo  que fizemos na Casa do Lago, na Unicamp, no último dia em que o estabelecimento recebia a sua exposição, queixa-se da falta de apoio e incentivo para esse tipo de arte: --- O brasileiro acredita que a cultura popular do país é coisa irrelevante, desabafa. Seus desenhos ornam uma gama imensa de produtos: canecas, bonés, camisetas, bolsas, xícaras e, claro, telas. Enquanto conta os meses e dias para tentar obter sua aposentadoria, que ajudará nas despesas primárias da casa em que reside com a mãe e um irmão, Guilherme continua fazendo arte e buscando viver com dignidade de seu trabalho artístico.  Um trabalho talentoso que merece ser conhecido e prestigiado.
Até amanhã amigos.


P.S. (1)  O contato com Guilherme Cotegipe pode ser feito no seguinte endereço: Rua Padre Leonel França, n. 170, Jardim Leonor, Campinas (SP). Cep. 13.041-190. Telefones: (019) 994407387. E.mail: guilhermecotegipe@ig.com.br.


P.S. (2) A Congada é uma festa popular originária de prática religiosa africana. Guilherme afirma que a primeira vez que viu uma congada foi em Monte Alegre, num passeio familiar no final de semana.



P.S. (3) A festa do Divino é uma festa religiosa portuguesa trazida para o Brasil no século XVI. No ritual a bandeira do divino, representada por uma pomba, é conduzida pela cidade.


P.S. (4) A imagem que abre a coluna de hoje é de uma tela de Guilherme denominada Trilhos Urbanos, na qual retrata uma paisagem urbana de bondes cortando as ruas de Salvador (Ba) e foi inspirada no poema “O Turista Aprendiz” de Mário de Andrade; A segunda tela  foi denominada Cangaceiros e está na categoria Político-Social. A terceira tela é Capoeira I. Todas as imagens foram emprestadas de guilhermecotegipe.blogspot.com.br, que você pode consultar para saber mais sobre o autor e suas obras.




Nenhum comentário:

Postar um comentário