Boa noite amigos,
Aqui vai, para alegrar o começo de semana, um novo "causo" que está no livro "Causas & Causos", o primeiro que escrevi e foi publicado pela Editora Millenium, de Campinas, em 2.006.
"Juiz novo assume pequena Comarca do interior do Estado
de São Paulo.
Jeito sisudo
vai logo dando conta do serviço para mostrar à população que não vem p’rá
brincadeira.
Já enfrentando o primeiro processo, que é
criminal, depara-se com uma denúncia do Doutor Promotor a respeito de uma
tentativa de furto.
Ali se descreve
curiosa situação. Certo sitiante fora apanhado pela polícia, em dia e hora
mencionados, na chácara de um outro sitiante, no momento em que tentava consumar
o furto de porcos.
Recebida a
denúncia, marcou-se data para o interrogatório.
No dia aprazado, depois de indagar do acusado caipira
a respeito dos fatos, pergunta:
- O senhor
confirma ou nega a acusação?
O réu, tirando
respeitosamente o chapéu, se dirige ao Magistrado, dizendo:
- Ôi Dotô, eu
vô falá bem a verdade pro sinhô, porque eu não sô hôme de mentira. Essas coisa
que escrevero aí a meu respeito é uma grande calúnia, eu sô pobre mais sô
honesto, nunca me aconteceu uma coisa dessa, doutô, eu sinto inté vergonha.
O magistrado
intervém:
- Se o fato não
é verdadeiro, qual é a sua versão dele.
E de novo o
caboclo:
- Dotô. Eu vou
contá só a verdade pro sinhô. Nesse dia que está escrito aí nesse paper, eu
vinha a pé do meu sítio pra fazê umas compra na cidade. De repente me deu um apertamento
de intistino, coisa que não dá pra segurá de braba que é. Aí eu pensei de
repente. Eu não posso fazê essas vergonha aqui no meio da rua. Eu vi a cerca do
sítio do compadre e arresolvi pulá pra dentro para fazê minhas necessidade no
meio do mato. Eu vi memo que tinha uns porco lá. Mas dotô, pelo amor de Deus,
eu não sô home de pegá nada dos outros, Deus me livre! Aí doto, quando eu to
pronto pra levantar, me chega o dono do sítio com a polícia dizendo que eu ia robá
os porco. Por Nossa Senhora Aparecida, nem me passô pela cabeça isso.
O caipira, humilde e respeitosamente, simplório
defendia sua versão com tanta sinceridade e veemência, que o
Juiz registrou o seu depoimento e marcou audiência para início da instrução,
não sem ficar impressionado do que ouvira e assistira.
A primeira
pessoa a depor, na seqüência, era a
vítima, por sinal um outro caipira, também simplório e respeitoso, tanto quanto
o réu.
O Juiz que se impressionara e muito com a estória
contada pelo réu, dirige-se à vítima,indagando:
- Então o
senhor é que é o dono do sítio onde o réu foi surpreendido na tentativa de
furto.
– Sô, sim
sinhô.
- Pois bem,
diz o Juiz, no interrogatório ele garantiu que é pessoa honesta e que adentrou
a sua propriedade apenas para fazer necessidade fisiológica, tendo ocorrido,
portanto, um engano, quanto ao objetivo da invasão. O que é que o senhor acha
disso?
O matuto,
segurando timidamente no colo o velho e surrado chapéu de palha , vira-se ao
Juiz e responde, surpreso:
- Doutô, o que
eu acho? Quem sou eu pra acha arguma coisa. Se o sinhô que é um homem de muita
leitura, curto, tá achando que o home foi injustiçado, não vai sê eu que vô
achá arguma coisa.
O Juiz, animado:
- Bem, o senhor acha que pode ter havido mesmo um
engano, um erro, uma interpretação equivocada.
O matuto
enfático:
- Craro, craro
seu Juiz. Vai vê que o coitado foi lá memo fazê as necessidade dele e nóis
pensamo mar dele, né. Pode sê memo.
O Magistrado já convicto e pronto para ditar o
depoimento, remata:
- Bem, então ao
menos podemos assegurar a ele o benefício da dúvida. A tese dele é provável, é
possível, é plausível.
O caboclo:
- Se é prausíve
eu num sei, porque nem sei o que é isso. Mais pode ser memo verdade. Até dotô, eu quero falá uma coisinha
pro sinhô, quando nós cheguemos lá o
coitado tava com uma porca debaixo do braço.
Pequena pausa. E o remate:
- Vai vê que o coitado já tava
prontinho pra limpá a bunda quéla, né, doutô."
Até amanhã amigos.
P.S. A caricatura da coluna de hoje, denominada "Dois Caipiras" foi emprestada de blogdamamaegansa.blogspot.com.
P.S. A caricatura da coluna de hoje, denominada "Dois Caipiras" foi emprestada de blogdamamaegansa.blogspot.com.
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