segunda-feira, 13 de julho de 2015

O CAIPIRA E O FURTO DOS PORCOS - CAUSAS & CAUSOS



Boa noite amigos,

Aqui vai, para alegrar o começo de semana,  um novo "causo" que está no livro "Causas & Causos", o primeiro que escrevi e foi publicado pela Editora Millenium, de Campinas, em 2.006.


"Juiz novo assume pequena Comarca do interior do Estado de São Paulo.
 Jeito sisudo vai logo dando conta do serviço para mostrar à população que não vem p’rá brincadeira.
    Já enfrentando o primeiro processo, que é criminal, depara-se com uma denúncia do Doutor Promotor a respeito de uma tentativa de furto.
 Ali se descreve curiosa situação. Certo sitiante fora apanhado pela polícia, em dia e hora mencionados, na chácara de um outro sitiante, no momento em que tentava consumar o furto de porcos.
 Recebida a denúncia, marcou-se data para o interrogatório.
No dia aprazado, depois de indagar do acusado caipira a respeito dos fatos, pergunta:

 - O senhor confirma ou nega a acusação?

 O réu, tirando respeitosamente o chapéu, se dirige ao Magistrado, dizendo:

- Ôi  Dotô, eu vô falá bem a verdade pro sinhô, porque eu não sô hôme de mentira. Essas coisa que escrevero aí a meu respeito é uma grande calúnia, eu pobre mais honesto, nunca me aconteceu uma coisa dessa, doutô, eu sinto inté vergonha.
 O magistrado intervém:

-  Se o fato não é verdadeiro, qual é a sua versão dele.

E  de novo o caboclo:

 - Dotô. Eu vou contá só a verdade pro sinhô. Nesse dia que está escrito aí nesse paper, eu vinha a pé do meu sítio pra fazê umas compra na cidade. De repente me deu um apertamento de intistino, coisa que não dá pra segurá de braba que é. Aí eu pensei de repente. Eu não posso fazê essas vergonha aqui no meio da rua. Eu vi a cerca do sítio do compadre e arresolvi pulá pra dentro para fazê minhas necessidade no meio do mato. Eu vi memo que tinha uns porco lá. Mas dotô, pelo amor de Deus, eu não sô home de pegá nada dos outros, Deus me livre! Aí doto, quando eu to pronto pra levantar, me chega o dono do sítio com a polícia dizendo que eu ia robá os porco. Por Nossa Senhora Aparecida, nem me passô pela cabeça isso.

O caipira, humilde e respeitosamente,   simplório defendia sua versão com tanta sinceridade e veemência,   que o Juiz registrou o seu depoimento e marcou audiência para início da instrução, não sem ficar impressionado do que ouvira e assistira.
 A primeira pessoa a depor, na seqüência,  era a vítima, por sinal um outro caipira, também simplório e respeitoso, tanto quanto o réu.

O Juiz que se impressionara e muito com a estória contada pelo réu, dirige-se à vítima,indagando:

 - Então o senhor é que é o dono do sítio onde o réu foi surpreendido na tentativa de furto.

 – , sim sinhô.

  - Pois bem, diz o Juiz, no interrogatório ele garantiu que é pessoa honesta e que adentrou a sua propriedade apenas para fazer necessidade fisiológica, tendo ocorrido, portanto, um engano, quanto ao objetivo da invasão. O que é que o senhor acha disso?

 O matuto, segurando timidamente no colo o velho e surrado chapéu de palha , vira-se ao Juiz e responde, surpreso:

 - Doutô, o que eu acho? Quem sou eu pra acha arguma coisa. Se o sinhô que é um homem de muita leitura, curto, tá achando que o home foi injustiçado, não vai sê eu que vô achá arguma coisa.

O Juiz, animado:

- Bem, o senhor acha que pode ter havido mesmo um engano, um erro, uma interpretação equivocada.

 O matuto enfático:

 - Craro, craro seu Juiz. Vai vê que o coitado foi lá memo fazê as necessidade dele e nóis pensamo mar dele, né. Pode sê memo.

O Magistrado já convicto e pronto para ditar o depoimento, remata:

 - Bem, então ao menos podemos assegurar a ele o benefício da dúvida. A tese dele é provável, é possível, é plausível.

O caboclo:

 - Se é prausíve eu num sei, porque nem sei o que é isso.  Mais pode ser memo verdade. Até dotô, eu quero falá uma coisinha pro sinhô,  quando nós cheguemos lá o coitado tava com uma porca debaixo do braço.

Pequena pausa. E o remate:

                                          -  Vai vê que o coitado já tava prontinho pra limpá a bunda quéla, né, doutô."


Até amanhã amigos.

P.S. A caricatura da  coluna de  hoje, denominada "Dois Caipiras" foi emprestada de blogdamamaegansa.blogspot.com.
                                          

                                                            


Nenhum comentário:

Postar um comentário