Boa noite amigos,
Eddie e Alicia contracenando nos papéis das pintoras Lili
Elber e Gerda (imagem emprestada de www.adorocinema.
com.).
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Comemorado como mais uma produção binacional de dois grandes
parceiros (Reino Unido e Estados Unidos)
e direção bem ao estilo de Tom Hooper,
que já enveredara, com sucesso, pela categoria do chamado cinema de época (antes, o
premiado O Discurso do Rei), o drama cinebiográfico, The
Danisch Girl, traduzido no Brasil como A Garota Dinamarquesa, e,em Portugal,
como A
Rapariga Dinamarquesa, é um belo filme, destacando-se duas soberbas interpretações dos
protagonistas, Eddie Redmayne (no
papel da pintora Lili Elbe) e de Alicia
Vikander (interpretando a pintora dinamarquesa, Gerda). Revela, ainda, a
sensível fotografia de Danny Cohen e
uma trilha sonora que se harmoniza perfeitamente com o clima intimista e de certo suspense em que se desenvolve o drama, a
cada cena, a cada abertura ou fechamento de uma porta, ou a entrada e saída de
numa clínica. O longa foi
indicado em quatro categorias ao Oscar de 2.016 (melhor ator, melhor atriz coadjuvante, melhor figurino e melhor design de produção). Só
Alicia levou a estatueta como melhor
atriz coadjuvante, um prêmio merecido. O seu desempenho foi tão bom na pele de Gerda, que há quem sustente devesse ser ela a
verdadeira protagonista, a própria Garota
Dinamarquesa, que dá nome ao filme. Trata-se de um roteiro adaptado do romance
homônimo de David Sbershoff, que
conta a história do pintor dinamarquês, Einar
Mogens Wegener e seu
relacionamento amoroso-profissional com a pintora compatriota Gerda. Em certa ocasião a esposa o
incentiva a posar para ela, como uma figura feminina, em substituição a uma modelo que faltara ao encontro, experiência que suscita no marido, a
descoberta de uma segunda identidade. A ambigüidade provocada pela representação e a identificação que ele sente se desenvolver no seu íntimo, na própria alma, como afirma em certo diálogo, leva Einar a se converter em Lili Elbe e a romper o casamento com
Gerda, com quem não consegue mais se relacionar como parceiro masculino.
O cenário é a Copenhagen de 1.920 e LiLi, sem entender esse aspecto
transgênero de sua personalidade, se submete a inúmeros tipos de profissionais
e tratamentos. Diagnosticada como doente, paranoica, esquizofrênica e anormal, foge de internações e tratamentos
convencionais, com a ajuda da própria ex-esposa e de um amigo de infância, até
que um médico francês reconhece a sua condição de transexual e se propõe a
realizar uma cirurgia de mudança de sexo, a que ela se submete, com todos os
riscos que isso implicava na época, para assim reconhecer-se como se vê e sente.
Reputa-se ter sido este o primeiro caso de cirurgia de mudança de sexo
realizada no mundo. Os personagens são reais, mas há os que defendem que tanto
o filme, quanto o romance no qual é baseado, não retratam exatamente a
realidade da vida e da relação entre as pintoras Lili e Gerda (para estes Gerda
seria lésbica e a relação entre ela e Einar nunca teria sido de um casal hetero
tradicional; Gerda não teria compreendido o marido e o acompanhado em todos os
seus passos seguintes, incluído a cirurgia, demonstrando carinho e amor
incondicionais como acontece no roteiro do romance e do longa;
o filme ignora a real causa da morte de Lili, e bem assim, o processo de
anulação do casamento que teria acontecido na vida real, etc., etc.). Apesar
disso, trata-se de uma cinebiografia, de um drama, que não se qualifica como
documentário e, por isso mesmo, não tem compromisso com a estrita realidade dos
fatos. E convenhamos, tanto o romance, quanto o cinema, não podem prescindir da ficção, do
compromisso estético próprio de toda forma de arte, assim como a licença
poética é conferida ao poeta para que a
poesia seja só e apenas poesia, catarse, ópio, fragmentos cuidadosa e seletivamente
recortados da vida real com coloridos próprios da ótica do autor.
A atriz Alicia Vikandir de 27 anos, vencedora do Oscar
2016, de melhor atriz coadjuvante pela sua Gerda de A Ga- rota Dinamarquesa (imagem emprestada de horadalitur.
blogspot.com.)
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Feita
essa observação necessária, diga-se que o longa prende, encanta e em certa medida
emociona e transporta o espectador para a
necessidade de entendimento e reflexão, ao tratar da difícil
problemática da transexualidade, numa época em que ela não era distinguida da
homossexualidade, ambas reputadas como patologias mentais, a sujeitar os seus
portadores a graves episódios de
auto-rejeição e culpa, a tratamentos inúteis e dolorosos, incluindo
internações, e ainda, a sanções sociais e jurídicas capazes de
mantê-los rejeitados e à margem das sociedades em que deveriam estar inseridos
e acolhidos.
O ator britânico, Eddie Redmayne, de 33 anos, recebendo
o Oscar de Melhor Ator pelo longa A Teoria de Tudo --
(imagem emprestada de www.darlymail.co.uk.).
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O enfoque da problemática vivida pelos transgêneros, porém, não é piegas e toda a mensagem é
transmitida em tom leve e sensível, para o que contribuem as ótimas
interpretações dos atores, os figurinos, a bela fotografia e o tom
intimista que permeiam as cenas e os diálogos, às vezes duros e dolorosos mantidos entre os
personagens. Um belo filme que merece ser visto, como cinema sério e de arte.
Até amanhã amigos.