terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

PASSIONE FORA DA LEI


Boa noite amigos,

                                                                 


Novela é obra de ficção e disso não se duvida. Porém, ainda que inexista o compromisso da mídia em transmitir conhecimentos exatos a respeito de certa área do conhecimento humano,  certo é que  a Globo tem se esmerado  em apresentar ao grande público de suas telenovelas, uma gama de  temas de interesse nacional, buscando, segundo sua própria auto-propaganda, equacioná-los de  maneira realística e adequada. Com isso, supõe prestar (e muitas vezes presta efetivamente) relevante contribuição  com o processo de educação e informação da sociedade em geral, carente de conhecimentos e, pois, de como lidar com essas questões. Por isso, não se compreende que numa mesma novela, no caso, a recém terminada “Passione”,  o autor Sílvio de Abreu tenha, de um lado,  buscado retratar, com elogiável realismo, por meio do personagem Danilo (em madura e ótima interpretação do jovem Cauã Reymond),  todo o  processo de dependência química, e ao focalizar a questão jurídica,  na farsa engendrada no pseudo assassinato de Totó (Tony Ramos), tenha apresentado uma sequência de barbaridades. Ai vão: a) teriam todos os Policiais, incluindo o Delegado de Polícia, participado da farsa do defunto que não morreu e já se sabia que não havia morrido? b) Poderia Clara ser presa, sem mandado de prisão preventiva ou temporária, muito tempo depois do pseudo-flagrante do falso homicídio? c) Responderia Clara por tentativa de homicídio? Tudo isso  (e os estudantes de Direito das 1as. Séries o sabem e não devem esquecer) se traduz em  teratologia que só se presta para iludir uma população que mal sabe a diferença entre Polícia e Justiça ou de como funciona verdadeiramente o Conselho de Sentença  em Tribunal de Júri no Brasil, muitas vezes  confundido com a sistemática norte-americana, totalmente diferente. Na hipótese, houvesse alguma possibilidade de crime, o  flagrante teria sido preparado, e pois inexistiria o  delito, uma vez que o bem de vida tutelado pela norma penal não teria corrido, em nenhum momento, o menor risco. Mas no caso ainda é pior: o crime cometido pela má Clara (boa, ótima, excelente Mariana Ximenes) é simplesmente impossível, na medida em que havia absoluta impropriedade do meio (bala de festim). Diz o art. 17 do Código Penal, ao descrever o crime impossível que “Não se pune a tentativa quando, por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta impropriedade do objeto, é impossível consumar-se o crime”. Como na maioria das vezes os autores utilizam consultoria de profissionais da área relativa ao conhecimento que pretendem explorar e divulgar (dizem mesmo que o ator que encarnou o  tal psiquiatra que tratou do Gerson,  era psiquiatra mesmo e dos bons), bem que se podia pagar uma consultoria jurídica adequada para evitar o que se tornou rotina nas novelas em geral, qual seja, o maltrato com as questões jurídicas ou legais mais elementares.
Ou, ao menos, considerando o compromisso divulgado pela emissora, de transmitir informações e conhecimentos reais sobre os mais variados assuntos focalizados na obra de ficção, uma observação de que, nesse ou naquele caso, a problemática jurídica não está sendo tratada rigorosamente “Na forma de Lei”, nome de uma de suas decantadas mini-série, para evitar que preste, aí sim, o desserviço de reforçar como verdade,  crenças manifestamente equívocas.

Até breve amigos.

P.S. - A imagem da coluna de hoje (da bela e boa atriz Mariana Ximenes no papel de Clara) foi emprestada do site www.obrejal.com.

Um comentário:

  1. Excelente, Dr. Jamil! Parabéns pela iniciativa do blog. Vamos acompanhar com prazer. E o que dizer da novela Duas Caras? Por que a mocinha não ajuizou nenhum tipo de ação em face do Ferraço? Um abraço, André

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