Caros amigos,
Foi num sábado do último mês de março, horário de almoço, no Giovanetti V, aqui em Campinas. O
estabelecimento, como de costume, àquela hora,
estava lotado e os burburinhos vinham de todos os cantos. De minha mesa
com os familiares tive a visão atraída para uma senhora negra, muito
sorridente, acompanhada por outra mulher, loira e mais jovem, brincando com uma
criança que passava com a mãe. Aquele rosto era familiar. Mas de quem, meu
Deus? Isso acontece tantas vezes agora que, chegando à terceira idade, vi,
revi, encontrei e perdi tanta gente nesta vida.
Milhares, seguramente. Mas para satisfação de meu ego, a minha
prodigiosa memória funcionou dali a não mais que alguns segundos. Eureka! Aquela
senhora é a Alaíde Costa. Quem?
perguntaram os meus familiares. A Alaíde
Costa, aquela cantora fantástica do tempo da Bossa Nova, do Fino da Bossa, dos Festivais. Com exceção de minha mulher e de minha sogra, os demais
adultos que se encontravam na mesa afirmaram desconhecê-la. Vocês vão lembrar, insisti. Em seguida
comecei a cantarolar Onde Está Você, a música mais conhecida
da cantora (Hoje à noite não tem luar/Eu não sei onde te encontrar/Pra Dizer como é
o Amor/Que eu tenho Pra te Dar). Parcialmente, em vão. E digo
parcialmente porque o Ricardo, não sei
se foi para encerrar o assunto ou para agradar, disse que se lembrava sim. Os
demais continuaram me olhando com aquela cara de “Pô, meu, que que é isso!”. Bem, não me fiz de rogado. Fui até onde
as senhoras ainda brincavam com a
criança. Toquei de leve o ombro da loira
e quando ela se virou eu pedi desculpas e perguntei: - É a Alaíde? E ela, simpática,
respondeu afirmativamente. Dirigi-me então à própria, indagando se poderia
abraçá-la. E ela nem respondeu. Abraçou-me imediatamente, abrindo aquele
sorriso imenso e receptivo, e eu
aproveitei para sussurrar no seu ouvido, dizendo que tinha muito, mas muito
prazer mesmo em conhecê-la. Que era seu fã, embora há muito tempo não a visse,
nem ouvisse falar dela. Como ela caminhasse
de volta para sua mesa, para não aborrecê-la, mas já pensando em
conversar um pouco, eu disse que iria até lá, dali há pouco. E fui. Ou melhor,
fomos: eu e a Mara. Ela estava lá com
vários amigos de Campinas e pediu que eu sentasse ao seu lado. Conversamos e
combinei com seus amigos e fãs que iríamos cuidar de trazê-la para um show aqui
na terrinha. Eles toparam (foto da ocasião que os amigos vêm na abertura desta coluna). Fiquei
com e.mail do pessoal para correspondermos acerca da nossa admiração pela amiga
comum. Quem sabe um dia desses a gente acerta com ela o tal espetáculo e
reunimos um pessoal para matar a saudades da
boa música, interpretada por uma cantora de verdade.
ALAÍDE COSTA – UMA VOZ
FORTE E SUAVE NA MPB.
Sua voz é grave e sussurrada. Perfeita tecnicamente. Mas o
seu canto não é só afinação. Transmite toda a emoção e o sentimento de quem
vive para interpretar os movimentos do corpo e da alma. Ela nasceu em 1.935 no
Rio de Janeiro. A carioca Alaíde Costa
Silveira Mondin Gomide, desde
cedo, mostrou sua vocação para a música. Aos 13 anos já se apresentava em
programas de calouro da inesquecível Rádio Nacional do Rio de Janeiro. Depois
no famoso programa de Ary Barroso, "Calouros em Desfile", no qual recebeu nota
máxima do exigente corpo de jurados. Em 1.955 passou a se apresentar
profissionalmente e dois anos depois gravou seu primeiro disco, um compacto
simples, em 78 rotações. Em 1.959, pelas mãos do pai da Bossa Nova, João
Gilberto, passou a frequentar e o tradicional Beco das Garrafas, referência no
surgimento do movimento que também se hospedava no vasto apartamento de Nara
Leão. Recebeu duas músicas para gravar: Minha Saudade de João Giberto e João
Donato e Lobo Bobo, de Carlinhos Lyra e Ronaldo Bôscoli. Dali por diante não
parou mais. Sucessivas gravações e apresentações no rádio, na televisão (especialmente
no programa Fino da Bossa, comandado por Elis Regina), e em teatros. Em 1.964 a carreira se
alavancou com a gravação da música “Onde Está Você” (de Oscar Castro Neves e
Luvercy Fiorini), seu maior sucesso. Gravou 15 discos em 50 anos de profissão.
Seu talento foi reconhecido no Brasil e no exterior, considerada uma das vozes
mais perfeitas da música brasileira. Seu vasto repertório inclui pérolas da
MPB, como Lobo Bobo, Insensatez, Desafinado, Samba do Avião, Preciso Aprender
a Ser Só, Adeus Batucada, Coisas do Mundo Minha Nega, Caminhos Cruzados, o
Barquinho, dentre outras. Cantou e se
apresentou com monstros sagrados de nosso cancioneiro, como Johnny Alf, Milton
Nascimento e Paulinho da Viola. Sua carreira intensa prosseguiu
pelos anos 80, 90 e 2.000. Em 2.008 participou, com grande sucesso, do show
“Maysa. Esta Chama Que não Vai Passar”, uma homenagem a outra grande cantora e
que foi encenado no Teatro Sesc da Vila Mariana, em São Paulo. A cantora me
disse que está bem de saúde e continua com aquela voz privilegiada e
encantadora. Um privilégio para ela e sobretudo para nós, seus fãs e
admiradores.
Até amanhã amigos.
P.S. (1) Três momentos marcantes da cantora: Em 1.969, com Johnny Alf, interpretando o clássico “Ilusão à Toa”; em 1.972 na gravação de
“Me Deixa em Paz” com Milton Nascimento, faixa do LP Clube de Esquina e, em 2.008, quando se
apresentou no show-homenagem a Maysa no Sesc da Vila Mariana;
P.S. (2) A carioca Alaíde mudou-se para São Paulo em 1.960, onde reside até hoje;
P.S. (3) A música “Me
Deixa em Paz” que a cantora gravou com Milton
Nascimento, no álbum Clube da
Esquina, de 1.972, é de autoria de Airton
Amorim e do saudoso Monsueto, e
não se confunde com aqueloutra de Ivan
Lins e Ronaldo Monteiro de Sousa,
com o mesmo título, que Elis Regina
gravou no LP “Elis” de 1.972;
P.S. (4) A Música “Me
Deixa em Paz”
de Amorim e Monsueto
foi lançada no Carnaval de 1.952, pela cantora Linda Batista e é considerada até hoje o maior sucesso de Monsueto. Foi gravada e cantada por
muita gente, ainda recentemente por Ana
Carolina.
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