Boa noite amigos,
Tema que hoje provoca acesas discussões entre
os doutrinadores, juízes, advogados e interessados, diz respeito à
possibilidade ou não de aplicação, no direito de família, entre cônjuges,
companheiros ou parentes, das regras
comuns relativas à responsabilidade civil. Há não muito tempo, o Superior
Tribunal de Justiça, por sua 4ª. Turma, rejeitou recurso especial do filho, pelo qual
pretendia ele obter
indenização ou compensação por dano moral, em ação movida contra o
genitor. A alegação utilizada foi a de que teria havido abandono psicológico ou
afetivo do pai, durante a criação do filho. Lembro-me que em palestra proferida
aqui na nossa Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de
Campinas, depois da exposição sobre responsabilidade civil, muito bem feita pelo culto
Desembargador-Aposentado e notável civilista, Dr. Carlos Roberto Gonçalves, especialista no assunto, uma
acadêmica indagou dele quanto à possibilidade de se obter indenização pelo não
exercício do direito de visita do pai ao filho, durante a menoridade.
O conferencista, de pronto, respondeu que não, porque "o direito de visita é uma faculdade e não se pode obrigar
alguém a amar outrem’. Desde que o pai cumpra com os deveres
impostos na separação ou divórcio relativos ao pensionamento do filho, nada
dele mais se pode exigir. Acontece que no dia de hoje, o mesmo Tribunal
Superior, por sua Terceira Turma, Relatora a Ministra Nanci Andrighi, decidiu
em sentido contrário, isto é, confirmou o V. Acórdão do Tribunal de Justiça de
São Paulo, que mandou pagar indenização à filha, pelo tratamento a ela dado
pelo pai, considerado discriminatório e de segunda classe. O Tribunal Paulista
chegou a fixar a indenização em R$415.000,00, valor esse que o STJ baixou para
R$200.000,00. Em seu voto, realça a Ministra que "amar é faculdade, cuidar é
dever". E mais adiante esclarece que: “Esse
sentimento íntimo que a recorrida levará, ad perpetuam, é perfeitamente apreensível
e exsurge, inexoravelmente, das omissões do recorrente no exercício de seu
dever de cuidado em relação à recorrida e também de suas ações, que
privilegiaram parte de sua prole em detrimento dela, caracterizando o dano in re ipsa e traduzindo-se, assim, em
causa eficiente à compensação”. É claro
que nas relações familiares o dano pode envolver diversos elementos subjetivos,
como a afetividade, o amor, o ódio, a mágoa, etc. Mas não viu nisso óbice ao
reconhecimento do direito de indenização à jovem, que foi considerada uma filha
de “segunda classe”, não foi reconhecida pelo pai, que ainda discutiu até o fim
ação de investigação do aludido parentesco. A
decisão ainda considera que a par de vínculos subjetivos como o amor e a
afetividade, existem outros vínculos entre os parentes, de natureza objetiva,
que obriga os pais à presença efetiva, seja por via do pagamento dos recursos
destinados à criação e educação dos filhos, seja em função de sua necessidade
de formação, frequentando colégios e tendo acesso a conhecimentos compatíveis
com a condição econômica da família Finalmente, considera que não existem
restrições legais à aplicação das regras da responsabilidade civil, cujos dispositivos
e elementos regulam, inclusive “os intrincados meandros das relações humanas”. E
com efeito, alarga-se entre nós, mais e mais, a exegese dos operadores do
direito, no sentido de contemplar, nas demanda em que se discutem relações
familiares, a aplicação ampla do princípio da dignidade da pessoa humana. A
decisão, por certo, vai dar muito o que falar. Mas, convenhamos, respeitadas as
peculiaridades de cada caso, não se vê porque excluir do âmbito da
responsabilidade civil por danos materiais e morais, as relações entre pais e
filhos, ou entre parentes em geral. Se o que informa a culpa, no ilícito
extracontratual ou aquiliano é a violação do chamado “dever de cuidado”, não há
cuidado que se imponha mais do que aquele legalmente imputado aos pais, de
zelar pela criação e educação adequada dos filhos, na menoridade.
Até amanhã.
P.S. - A imagem que ilustra a coluna hoje (pai e filha), foi emprestada do site vilamulher.terra.com.br.
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