Boa noite amigos,
O consagrado autor de telenovelas, Walcyr Carrasco, de sucessos como Chocolate com Pimenta, O Cravo e a Rosa, Xica da Silva, Alma Gêmea e
Morde & Assopra, tinha e tem
tudo para emplacar com a atual novela do horário nobre da TV Globo, Amor à Vida. Com
uma proposta supostamente nova e mais envolvente, com roteiro, situações e
personagens pendendo mais para a realidade, tudo indicava que a novela
redimiria a emissora das críticas sofridas com a antecessora, da não menos
competente autora Glória Perez. Nos últimos capítulos, porém, parece que a
síndrome de Salve Jorge ataca de
novo, arrastando a trama mais para o lado do fantástico ficcional, do que para
o da realidade com concessão poética. Cenas anteriores como a da dedicada
esposa e mãe, mulher de bom caráter, Pilar (Suzana Vieira), oferecendo dinheiro para Bruno (Malvino Salvador), com o objetivo de solucionar a questão da
guarda de Paulinha (Klara Castanho), visando proteger a
estabilidade emocional da filha postiça, Paloma
(Paola Oliveira) e a situação
econômica do hospital do marido, Cesar
(Antonio Fagundes) pareciam
sinalizar mesmo para a propalada redenção
e mudança de rumo na linha da dramaturgia da emissora. O vilão da história, o invejoso e sem caráter, Felix Khouri (Mateus Solano), aparece
também na pele de um homossexual, num
indicativo de que o autor não se preocupou em criar sobre o politicamente correto,
nem com eventuais acusações idiotas e
exageradas de homofobia ou preconceito. Até então os autores em geral preferiam
mostrar os homossexuais como pessoas
sempre boas, corretas, perseguidas
injustamente pela opção sexual etc. Por outro lado, ao tratar de temas afetos a
várias áreas específicas do conhecimento humano, tenho sustentado (e a própria Globo já fez isso muitas vezes), que é
indispensável ao autor, consultoria adequada, para não cometer certas heresias.
Não se trata apenas de apego exagerado à realidade, mas sim da constatação de
que com a penetração das novelas, sobretudo nas classes mais humildes, ao
tratar de temas delicados como inseminação artificial, barriga de aluguel,
linfomas, guarda de filhos etc., a obra
de dramaturgia chega ao expectador como uma verdade também de seu mundo, pois
ele não é capaz de separar, em temas técnicos e complexos, o que é real e o que
é ficcional. A Juíza que apareceu julgando a quem deveria ser concedida a
guarda de Paulinha exibe um envelope
com o resultado do exame de DNA e depois de afirmar que ele está juntado aos
autos (e ele não está), termina com a seguinte e surpreendente frase: “Ante o exposto eu decreto que Paula ......
não é filha de autora, Paloma Khouri”. Escorregadas terríveis perceptíveis
mesmo para o leigo: Afinal, alguém já ouviu Juiz decretar realidade
biológica? Tem mais: com dois exames de DNA, um afirmando que Paloma é a mãe, e
o outro negando a sua maternidade, fosse este último oficial ou não, como é que
se aceita essa contradição e não se faz um terceiro laudo? Por acaso aqueles
brilhantes advogados contratados pelo Dr.
César e maltratados pelo tal Félix
(o que tem gerado a ira de advogados e pessoal do meio jurídico) deixariam que
a questão fosse solvida dessa forma, sem
qualquer pretensão de novo exame que pudesse revelar qual dos laudos
estaria correto? Ademais, havia um evidência escandalosa de erro ou falsidade do segundo laudo, porquanto Paloma doou
parte de seu fígado à menina, depois de se constatar inteira compatibilidade que,
como se sabe, sempre é encontrada em parentes, e quase nunca
em estranhos. Despeça esses advogados cara Paloma.
Agora a Associação Brasileira de Hematologia, Hemoterapia e Terapia Celular
(ABHH), em comunicado que divulgou
na última sexta-feira, afirmou que o
câncer de Nicole (Marina Ruy Barbosa), revelado como se tratando de um linfoma de Hodgkins tipo 4,
ao contrário do apregoado, é “altamente
tratável e curável”. E que, mesmo
nos casos em que é detectado tardiamente, como na trama, o percentual de cura é
superior a 80%. Em resumo, mata menos que as patologias comuns, consideradas
não letais. Ora, é inadmissível que o
autor, referindo-se a uma doença real e bem definida pela ciência, cometa o
desserviço de informar à comunidade dados falsos acerca desse mal. Nesse
ponto a tal licença poética é absurda. Escolhesse
então um nome fictício para a doença, sob o pretexto de ser ela raríssima e desconhecida, com pouca ou nenhuma
literatura. O compromisso maior com a educação real da população deve ser a
primeira preocupação da mídia em geral e da TV Globo, em particular, dado os altos índices de Ibope de sua programação, e das
telenovelas, em particular. Não quero ser chato como esse povo que vive
pegando no pé dos autores, não dando o devido desconto de que suas obras são fruto de ficção. Gosto,e muito, de arte ficcional, em particular quando elas revelam a
grande capacidade do autor na utilização do improvável, do absurdo, do exagerado, como elemento de construção de
refinada crítica social e política. Mas
aí é outra história. Um dos folhetins mais interessantes que a mesma emissora
transmitiu há muitos anos, e que agora, é exibido num “remake” é Saramandaia, do saudoso Dias
Gomes. Na sua fauna humana, há homens que viram lobisomen, que soltam
formigas, pelo nariz, ou o coração pela
boca, mulheres gordas que explodem de tanto comer, ou que pegam fogo, pela
fogosidade sexual. É outro papo, porém. No entanto, quando o
autor se propõe a construir trama mais voltada para a realidade, ao que
ordinariamente acontece, aquele envolvimento que se acaba tendo com os
personagens e as tramas, pelo excelente roteiro e trabalho dos atores, começa a desaparecer quando, de repente, nessa
interatividade, sem mais, nem menos, surge
o elemento improvável. Aí a gente cai na real de que é
tudo mentira mesmo, o tesão desaparece, a gente se sente meio palhaço, levanta do sofá e vai ver o que é que tem na geladeira para comer. É
ruim hein!
Até amanhã amigos.
P.S. (2) Excelente a
atuação do grande ator, Mateus Solano,
na pele do vilão Felix. Um presente
para o ator e também para o telespectador, inclusive pelos textos bem humorados
do personagem;
P.S. (3) Dizem que a personagem Nicole (Marina Ruy Barbosa), depois de morrer do tal mal polêmico,
vai voltar como fantasma para assombrar a vida do marido Thales (Ricardo Tozzi) e de sua amante, Leila (Fernanda Machado). Se isso é certo, há que se considerar que
Carrasco não resiste mesmo e sempre
acaba incluindo um tema espírita nas suas novelas;
P.S. (4) A 1a. imagem da belíssima Marina
Ruy Barbosa foi emprestada de entretenimento.r7.com.,
e a 2a., de Walcyr Carrasco de rd1.ig.com.br;