sábado, 24 de setembro de 2011

FACULDADE DE DIREITO DA PUC CAMPINAS 60 ANOS - O DISCURSO PARA A TURMA DE 86


Boa tarde, amigos.
A foto ao lado é de formandos em Direito que colaram grau em 02 de julho de 2.011, em Salvador (Bahia) e foi extraída do site de responsabilidade da empresa seuevento.net.br. Parabéns a todos eles e  votos de profícua carreira.
Ontem, falei da inesquecível Turma de Formandos de 1.986, da querida Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Campinas. Lembrei cada um dos formandos e dos colegas docentes que comigo dividiram  a honra da eleição de paraninfo e patronos, naquela ocasião.  Hoje quero registrar o meu pronunciamento feito no dia 13 de janeiro de 1.987, na solenidade de Formatura realizada no Teatro do Centro de Convivência Cultural, em Campinas.  Estava envaidecido e sensibilizado pela escolha dos meus alunos, mas extremamente preocupado com a mensagem que gostaria de transmitir-lhes, sem qualquer artifício ou demagogia,  sobretudo pelo fato de que eu era ainda um jovem professor e tinha acabado de ser aprovado em Concurso Público para a Magistratura do Estado de São Paulo e tomaria, como efetivamente tomei posse,   no mês de maio subseqüente. Foi um discurso curto pelos padrões daquela época, mas suficiente para transmitir aquilo que sentia.Ei-lo:
Meus queridos Bacharéis. Em toda separação mescla-se um sentimento profundo de emoção, com um prenúncio de saudade. Tantos, porém, são esses momentos no caminho de nossa existência terrena, que apenas o culto à lembrança e a aptidão para gravar no coração e no espírito a presença que os olhos já não mais poderão registrar amiúde, constituem o único remédio amargo que, se não cura, insiste em manter candente a chama que eterniza a amizade e o amor, na primavera e no inverno de nossas vidas. Certo é que no nosso caso, não se cuida de uma separação drástica e definitiva. Qualquer dia, qualquer hora, diz a canção popular e eu repito, a gente se encontra por aí; mas o velho professor, que nutre a veleidade de lhe dirigir os passos até aqui, nos encontros certos e pré-fixados no seio da vetusta academia, sabe que não mais figurará na pauta de suas agendas. Agora haverão de andar com os próprios pés e os caminhos terão que ser traçados e percorridos com extrema cautela. Sei e os advirto, derradeiramente, que nem os pequenos erros lhes serão perdoados com facilidade e complacência. A complexidade do mundo que está lá fora cheio de desafios e armadilhas, recomenda prudência, perseverança, retidão, renúncia, fortaleza e humildade.  Não creiam que os valores fundamentais são contingentes. Não são e não são, definitivamente. Não se percam no labirinto dos caminhos suaves e aparentemente elegantes que os arrastará para os sucessos materiais. Não sucumbam, com facilidade, diante de um argumento qualquer de persuasão, diante do medo, da expectativa de fama e fortuna, de modismo, etc. Aprendam a auscultar a própria consciência, amiga leal que nos orienta na reflexão surda e solitária da madrugada e ela lhes indicará o caminho a seguir, reservando-lhes de vantagem, uma profunda harmonia interior que lhes permitirá repousar o corpo fatigado, mas honrado, sobre o leito noturno. Não olvidem que o talento de seus argumentos, construídos com engenho, lógica e argúcia nada dirão se os seus olhos não emprestarem um cunho de sinceridade e de verdade, à recomendação ou postulação. Há muito vai se perdendo, na noite implacável dos tempos, a velha concepção de que os homens são medidos pelo que dizem. Obtemperariam vocês: E os poetas? Como julgá-los, então? Os poetas, malditos e benditos em todos os tempos e lugares, acariciam os nossos ouvidos, embelezam a nossa alma e encantam o nosso coração. Mas somente eles, seguramente os únicos, é que terão o direito de julgamento pela história, apenas pelo que dizem, escreveram ou disseram. O torpor dos discursos inebriantes desaparece como a   euforia da embriaguez se esvai no dia subseqüente, deixando um gosto acre na boca e um vazio na alma. Só o exemplo é que fica. E é o que fica, no final e perenemente. Hoje estamos aqui, realizando uma solenidade sem máscaras, fantasias ou dissimulações. É o resultado de uma luta que planejamos e vencemos juntos. Uma batalha dura que nos machucou a todos intensamente, vez que parte do nosso coração restou esfacelado pelo caminho. Mas foi uma vitória moral. A permuta do discurso pela ação. É assim que começa a nossa missão. Árdua missão de servir de bússola a essa comunidade que quer mudar, sabe que precisar mudar, porém não sabe como deflagrar esse processo de mudança. Essa sociedade, fatigada e angustiada, que não vive o mundo do “faz de conta” das promessas ocas e oportunistas, lançadas levianamente na  retórica daqueles que reduzem o nobre sentimento de esperança a uma alvo predileto de egoístas aspirações políticas e individualistas. Não creiam na balela de que os fins justificam os meios, como se a ação pudesse ser retalhada e apartada em sua finalidade, de sua moralidade intrínseca. Afinal, muita vez, o que se sacrifica pelo caminho é tão fundamental que, diante disso, não importa mais o resultado. Trabalhem pelos pobres, pelos oprimidos, pelas minorias que nasceram marginalizadas sem pecado e sem delito. Suas causas não lhes trarão dinheiro, fama ou repercussão. Todavia, o mérito desse labor estará em que prestarão um testemunho cristão ao mundo, reafirmando sempre que a Justiça é um direito de todos, o acesso é um direito de todos e que nem as contingências de um país miserável,nem os defeitos aparentemente irreversíveis dos homens ou da filosofia que animam instituições alimentadas a séculos para servir facções ou classes, pessoas ou raças, são capazes de desencorajar a luta segura e definida por um mundo igual e sem preconceitos. Essa luta será marcada pela certeza de que, entre homens que nascem iguais e são sepultados na mesma terra, as diferenças ou privilégios se traduzem em grave equívoco ou num mero acidente de percurso. Gostaria, agora, de lhes pedir perdão pelo que não lhes ensinei, porque também não aprendi, e pelo que, tendo aprendido, não consegui ensinar. Uma palavra de agradecimento pela convivência que mantivemos nesses quatro anos passados, dentro dos quais experimentei a grata sensação de que na vida se é mestre e discípulo a cada momento. Ofereço-lhes, finalmente, o meu coração. Foi através dele que consegui muitas vezes eco e compreensão naquilo que os meus recursos, pobres de retórica, não permitiam transmitir. O amor foi fundamental nessa relação. Afinal, como ensina Duclois, a linguagem do coração é universal. Uma vez constante, ela abre os nossos sentidos, tornando-nos capazes de ouvir no silêncio e ler por entre os olhos, senão de ouvir estrelas, como adverte a poesia imorredoura de Bilac..... “Amai para entendê-las. Só quem ama pode ter  ouvido. Capaz de ouvir e de entender estrelas”. Oferto, por fim, a minha solidariedade. Nos momentos de desânimo, de desalento, de ingratidão, de perseguição, que não serão poucos, não se deixem abater. Lembrem-se que nenhum flagelo será capaz de fazer combalir um grande espírito que busca acertar, consciente e honestamente, a meta projetada, razão da própria existência. Lembrem-se, sobretudo, de que lá na minha modesta casa, e na casa de cada um dos mestres que ora testemunham a justeza de cada grau outorgado, existe alguém que torce por vocês. Deus os abençoe pela vida e para sempre,  meus amigos.”
Até amanhã.

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