quarta-feira, 24 de agosto de 2011

CINEMA - UM INSTANTE DE INOCÊNCIA

Parodiando o “Cogito ergo sum” de Descartes, eu poderia dizer: “tenho uma imagem, logo existo” Que seria o mundo, que visão teríamos de nós mesmos, se não existisse a possibilidade de oferecer a cada um seu reflexo, seja o de uma fotografia, de um espelho ou de um reflexo na água? Todos têm necessidade e vontade de ver sua imagem. Porque somente ela nos permite acreditar em nós mesmos e de tomar consciência de nossa existência” (Abbas Kiarostami, 1.994).
Boa noite amigos,
Vamos falar de cinema produzido por cineastas iranianos. Sim, iranianos. O bom cinema iraniano. Os bons cineastas como Abbas Kiarostami, também fotógrafo e poeta, que se tornou conhecido no mundo ocidental, nos anos 90, a partir da revolução islâmica. Dirigiu filmes de sucesso como  Onde fica a casa do meu amigo? vencedor do Festival de Locarno em 1.987, A Vida Continua (1992) e o Gosto de Cereja (1.997). Porém, seu filme mais conhecido, de sucesso, é Close-Up (1990), objeto de muitas discussões, trabalhos e discursos acadêmicos e no qual dirige um outro grande cineasta conterrâneo, Moshen Makhmalbaf. A originalidade está na ideia de um cinema-imagem, que inspira  reflexão sobre a existência e o auto-conhecimento (vide a bela  mensagem acima do fotógrafo-poeta-cineasta), e que, sobretudo, convida o espectador a dele participar,  um cinema de ruídos e silêncios profundos, que dialogue com o espectador. Pois bem, Moshen Makhmalbaf é outro diretor genial.  Um Instante de Inocência (Num Va Goldun, Irã-França, 1.996),  um drama de 78 minutos,  é reconhecido como seu primeiro sucesso no Ocidente. No longa, Makhmalbaf, que interpreta a si mesmo, reconstitui o episódio real que viveu quando tinha 17 anos e era militante muçulmano combatente, em luta armada, da ditadura do Xá Reza Pahlevi. Como precisasse de um arma, não teve dúvidas em ferir com um punhal um guarda do Xá, para tomar-lhe o revólver. Foi preso e o guarda, internado,   perdeu, no mesmo episódio, a jovem que iria pedir em casamento naquele mesmo dia e que desapareceu de sua vida, alterando-lhe o curso profundamente.   Tendo já se tornado cineasta famoso, o diretor reencontra o policial, a quem prometera um dia lhe oferecer papel  num filme e este  lhe cobra a montagem e a participação. É disso que trata Um Instante de Inocência, um filme que diverte, envolve e emociona, como afirma João Gabriel de Lima. E basicamente coloca em discussão algumas reflexões necessárias sobre o ser humano: como é difícil reconstituir situações vivenciadas no passado, sem que elas se alterem pela visão equivocada e subjetiva que temos e carregamos a respeito delas; como é complexo separar o que faz parte objetivamente da realidade e aquilo que a nossa imaginação construiu, sedimentou e conservou na memória dos fatos. Bem, a técnica usada pelo diretor é bastante interessante, reproduzindo a mesma cena inúmeras vezes, indo e voltando no tempo (o que é a gravação agora e o que foi o fato que aconteceu e como aconteceu). O filme também traz o universo do jovem politicamente engajado nos pulsantes 17 anos,  na crença purista de ser predestinado e  capaz de salvar a humanidade. Documenta  a opção pela luta armada como contradição na busca da liberdade, da paz e da justiça social,  na metáfora da arma e da flor e na   sutileza da retrospectiva que mexe com as essências e os valores dos personagens e dos atores novos e antigos. Enfim, um filme sensível e profundo, que bem reflete o bom  cinema dos iranianos e merece aplausos. No elenco, Moshen Makhmalbaff (ele mesmo), Miryam Mohamadim (amada do policial) e Mhyradi Tayebi (policial).
Não deixe de ver.
Até amanhã.




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