Boa noite amigos,
No
ano de 2.008, ao ensejo de mais uma semana de Estudos Jurídicos da Faculdade de
Direito da Pontifícia Universidade Católica de Campinas, a Comissão
Organizadora formada pelo Centro Acadêmico XVI de Abril e professores, além da
Direção da Faculdade, decidiu homenagear personalidades que contribuíram para a
história da instituição. E na noite do dia 25 de setembro daquele ano, por
razões de vinculação afetiva e histórica que mantive com o Professor Doutor
Walter Hoffmann, coube-me a honrosa incumbência de proferir o discurso em sua
homenagem, retratando o seu perfil de homem, profissional e docente. Resolvi
publicar essa saudação, não por mera vaidade, mas porque considero a memória e
a gratidão, dois valores fundamentais na formação humanística das pessoas,
sobretudo numa Faculdade de Direito. E aqui menos que a memória do teor do
discurso ou de seu autor (o que é irrelevante), avulta os dados que revelam
quem foi e o que fez o Professor e Vice-Diretor da Faculdade de Direito de
nossa faculdade. Foi assim: “Excelentíssimo Senhor Professor Marcelo Hilkner
Altieri, Digno Diretor Adjunto da Faculdade de Direito da Pontifícia
Universidade Católica de Campinas. Excelentíssimo
Senhor Professor Antonio Paiva Carvalho, em nome de quem saúdo os demais
professores presentes. Prezados
acadêmicos representantes do tradicional e atuante Centro Acadêmico XVI de
Abril da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Campinas. Caros
Alunos, Senhoras, Senhores. Aos filhos do homenageado aqui presentes, Ricardo,
Cristina e Marlene. A morte é, a um
só tempo, cessação e rompimento. Fecha-se o
ciclo da vida e o homem volta à sua
origem: pó ou alma, terra ou eternidade.
Deixa para trás a vida biológica finita. E uma história! Ouvi de um poeta, de
certa feita, e gravei, que só se morre
realmente pelo esquecimento. Os
grandes homens, assim, não morrem, pois permanecem vivos, intensos, na
lembrança de suas boas ações e na
saudade dos que sentem a sua ausência, nas suas vidas. Vai-se a vida. Fica a memória. Dentre os
valores fundamentais à formação do Bacharel, em qualquer instituição de ensino,
destacam-se o culto à memória e o sentido de Justiça. E é em nome, sobretudo,
desses valores, que se presta hoje, nesta casa, durante a semana de Estudos
Jurídicos, uma justa homenagem a uma personalidade que, pela importância de sua
atuação social, transcendendo a advocacia
e a docência, esteve, durante significativo tempo de sua
existência, ligado umbilicalmente, em corpo e espírito, à nossa velha e
tradicional Faculdade de Direito. Walter Hoffmann teve a grata honra de viver
nesta casa duplo papel: de aluno e de mestre. A dignidade de compor a importante,
histórica e saudosa 1ª. Turma, de Heitor Regina, Carlos Soares Junior, José
Carlos Virgílio, dentre outros, formada
já no distante ano de 1.957 e a qual se deve a responsabilidade pelo começo de
um dos mais relevantes cursos de Direito do país, cuja qualidade de ensino é sobejamente conhecida e atestada
por instituições como o Poder
Judiciário, o Ministério Público e a Ordem dos Advogados do Brasil. Filho de
Ricardo Hoffmann (ferroviário) e de Dna. Maria Delle Done Hoffmann, uma costureira, natural
desta cidade de Campinas, Walter nasceu no dia 16 de janeiro de 1.933. Oriundo de família humilde, mas de valores, e
ainda colhido na primeira infância por uma infecção que o levaria a conviver
com uma deficiência mecânica, jamais se esmoreceu e, superando adversidades e
dificuldades, estudou e trabalhou para realizar o seu sonho que era formar-se advogado. Ajudando
a família com vários empregos e atividades, inclusive a de radialista, logrou
obter bolsa de estudos para o perseguido
curso universitário. Colando grau, valorizou essa história e o auxílio recebido,
tendo dado à cidade de Campinas e às suas instituições, em manifesta gratidão, inestimável
colaboração com trabalho e fidelidade. Inúmeros os títulos de reconhecimento à
sua dedicação e competência: Professor Emérito de Campinas, conferidos em
1.979, pelo Sindicato dos Professores de Campinas; Medalha Carlos Gomes;
Cidadão Emérito de Campinas, por decisão unânime de sua Câmara Municipal, dentre outros. Incontáveis
as funções que exerceu com brilho durante os mais de 75 anos de fecunda
existência. Releva aqui
acentuar que nesta casa foi Professor de Direito Comercial por quase 35 anos,
de 1.965 a
2.000. Foi,
ainda, Vice-Diretor da Faculdade de Direito de 1.991 a 1.993 e Coordenador do Departamento de Direito
Privado, em variados períodos. Paralelamente, foi Consultor Jurídico do
Sindicato dos Professores de Campinas, Consultor Jurídico das Prefeituras Municipais
de Campinas e Indaiatuba, Professor e Diretor da Faculdade de Direito de
Espírito Santo de Pinhal e, posteriormente, Reitor naquela instituição até o
seu falecimento, ocorrido recentemente. Por suas mãos, e sob sua firme
orientação, iniciei eu, no também já distante ano de 1.972, o exercício
nobilitante da advocacia, ainda como aluno e estagiário. Era o
princípio de um relacionamento entre
mestre e professor, depois entre profissionais e amigos, que perdurou por toda
a vida, conquanto nos últimos anos, por circunstâncias profissionais, não nos
víssemos com freqüência, o que em nada alterou a admiração e o carinho
recíproco que nutríamos. Coube-me, por
isso, só por isso, exatamente por isso, talvez, a tarefa de conduzir essa
homenagem nesta noite, homenagem que não é minha, mas de toda a comunidade
acadêmica. Gostaria de dizer a todos os senhores presentes que são
inesquecíveis, para mim e para todos os seus ex-alunos, as aulas de Direito
Comercial que ministrava de forma segura e apaixonada. Remanescem vivas na retina e na memória os
conceitos que transmitia, com desenvoltura, sobre títulos de crédito, teoria da
inoponibilidade das exceções pessoais e do negócio subjacente ao terceiro de
boa fé em direito cambiário, a distinção entre sociedade de pessoas e as de
capital, os aspectos relacionados à ação renovatória e a Lei de Luvas, sobre a
caracterização da falência, e, assim por diante. Penso que as
característica mais marcantes de sua personalidade tenham sido o amor pelas profissões que abraçou, quais
sejam, o magistério superior e a advocacia, respectivamente, por sua família, mormente pelos quatro filhos
e oito netos e a serenidade com que enfrentava todas as situações, fossem quais
fossem, a ponto de eu jamais ter presenciado uma alteração no timbre de voz. Essa
paz, essa tranqüilidade, com que nos brindava, convertia-o em uma pessoa
especial, que buscava sempre a concórdia, a conciliação. Sábio, era consciente
da relatividade da vida e das coisas. E a cada um dos problemas ou supostos
problemas consigo ou com seus alunos, seus amigos, sua família, tinha a virtude
de emprestar a solidariedade e o ombro amigo. Dois de seus filhos seguiram-lhe os passos
profissionais: Ricardo e Cristina. Ricardo labutando na advocacia, nos
primeiros tempos de bacharel, logo logrou aprovação em Concurso da Magistratura
e é hoje ilustre Juiz Titular da 3ª. Vara Cível da Comarca de Campinas.
Cristina, igualmente advogada competente, ministra há anos, nesta casa, a
disciplina Direito do Trabalho Material e Processual, sendo reconhecida como
uma de suas melhores professoras. A imagem e a personalidade de Walter ficará
sempre em nós e nas coisas que vivemos juntos. Com seu estilo indefectivelmente
elegante nos gestos e no trajar, garantirá, por muito tempo, forte presença,
pelos corredores do Páteo dos Leões, pelos prédios do Sindicato dos
Eletricitários, do Sindicato dos Professores, pela Casa de Saúde, instituição que tanto e tão bem serviu. E a ele me dirijo finalmente para
dizer: Walter, esteja onde estiver, saiba que nós os seus alunos, os seus
parentes, os seus amigos, sentimos falta de sua companhia, de seus conselhos,
de suas aulas, de suas peças jurídicas. Uma saudade grande e serena, como
serenamente você nos ensinou a encarar as coisas da vida. Para dizer a você, como a canção popular que,
se é verdade que a gente leva da vida, a vida que a gente leva, obrigado pela
vida que você levou, e, obrigado pela vida que você nos fez viver na feliz contemporaneidade de
parte das nossas existências. Faço-o em nome de
toda a comunidade desta casa, com profundo respeito de eterno aluno e admirador
e grande saudade de amigo”.
P.S.
(1) a imagem da coluna de hoje é de um escrito, um singelo bilhete que o amigo
Walter me enviou em janeiro de 1.998, cumprimentando-me pelo aniversário.
Até
amanhã amigos.
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